sábado, dezembro 31, 2022

Entre o já e o talvez


Já esperei que a vida acontecesse, atrás da secretária da rotina.
Já me despistei com violência, à velocidade da ilusão.
Já tentei ser quem não sou, no palco dos outros.
Já julguei ser um poeta, porque escrevi algumas rimas.
Agora, depois de tantos "já", duvido que tenha aprendido alguma coisa para lá de frases feitas.
Já faço a vida acontecer, mas a rotina continua lá.
Já não me despisto, mas continuo a perseguir ilusões.
Já tenho o meu próprio palco, mas ainda não sei quem sou.
Já não acredito que seja poeta, mas cada vez vou escrevendo mais rimas.
Agora, depois de acumular tantos "já", assumo com humildade a minha ignorância. Pretendo continuar a aprender coisas novas, para conseguir crescer um pouco de cada vez. Ser como uma criança a descobrir o mundo, entre sentimentos de admiração.
Vou procurar também momentos de alegria. Descobrir algum tipo de esperança na companhia dos outros. Olhar para lá do horizonte e viver o amor na partilha de sonhos. Depois, volto aqui para escrever sobre isto, como já tantas vezes escrevi. Espero fazê-lo com um sorriso verdadeiro no rosto. É só isto que desejo. 
Talvez seja muito, quando a inquietude é tudo que conheço. 
Talvez seja pouco, quando a minha humanidade me convida a algo maior do que eu próprio. 
Talvez nada disso importe, já que cada um tem o seu caminho a percorrer. 
Hoje só faz sentido ser assim, com expectativas livres e a vontade de conhecer aquilo que de melhor o desconhecido pode dar!

sábado, dezembro 24, 2022

As cores que enganam a noite


O vampiro não compreende o Natal. Tantas luzes coloridas a violar a escuridão da noite. Gente feliz a passear pelas ruas da cidade sem se importarem com o frio. 

Fazem-se embrulhos para as prendas compradas porque assim manda a tradição. Os padres rezam missa em igrejas cada vez mais vazias. Há sempre uma religião que substitui a outra. Há sempre hereges que dizem adorar o Deus menino, para de seguida se vergarem à publicidade do Pai Natal. Hoje quem manda é o paganismo, o consumismo, ou também a política, ou então a alegria de ter companhia. 

Os sem-abrigo ficam invisíveis. Lá vai havendo um olhar mais atento pronto a dispensar uma esmola. Os mendigos apenas querem qualquer coisa quente, algo para o corpo, enganar o estômago e manter a ilusão viva de um amanhã melhor. 

Os solitários, também ninguém os escuta. Ficam escondidos Como se as festas lhes fossem proibidas.

Lá longe, está a guerra. Pobres coitados nos títulos das notícias. Apenas isso. Não há vampiros na guerra. Só pessoas de carne e osso que mal reparam na data. Cada dia que passa é uma vitória, sem Pai Natal com presentes, ou padres com homilias.

O vampiro saiu para caçar e não demorou até encontrar uma presa. Mordeu, como mandam os seus instintos, a veia mais proeminente. Bebeu, mas estava vazio. Precisava de mais. Sentir os sonhos da sua vítima. Contudo no Natal os sonhos são escassos. 

Continuou a procurar. Não tardou até capturar outro humano, bebeu mais uma vez e sabia a nada. Olhou para a cidade. Tinha a consciência de que ali não ia encontrar alimento. Em cada ano que passava a multidão tinha menos vida.

As cores enganam a noite, ludibriam também os sentimentos. O riso do Pai Natal fascina as crianças. Os enfeites mascaram todo o cinzento na paisagem da existência. Sonhadores deixam de o ser. Trocam a sua fantasia por aquela que é vendida.

Esta festa toda é muito confusa para quem só quer simplicidade. Perdido no meio de tantos pedidos, o vampiro lamentou desejar apenas um pouco de amor.


sábado, novembro 12, 2022

"Para sempre. Aqui estou."

"Para sempre. Aqui estou." O rapaz soltou estas palavras com a cara mais séria do mundo.

O pai, o mesmo que era suposto apoiar o filho, não conseguiu conter uma gargalhada barulhenta. O rosto ficou vermelho com tanto riso e as lágrimas começaram a cair em abundância, mais parecia um desenho animado. A certo momento atirou-se para o chão onde se começou a rebolar no meio daquelas gargalhadas surreais.

O filho só queria um conselho sobre quais as melhores palavras a dizer à rapariga por quem estava apaixonado. Supostamente o pai seria a melhor escolha para esta função, ou assim julgava ele. Mas ao ver aquela figura desconchavada a contorcer-se pelo chão como uma minhoca bailarina, ficou bem arrependido por lhe ter pedido ajuda. Nunca pensou vir a ser tão gozado pelo próprio pai!

Alertada por aquele chinfrim a mãe não tardou a aparecer para ver o que se passava. Ao deparar-se com aquela cena, questionou pasmada: “Mas que maluqueira é esta”!?

O filho com cara de amuado não respondeu. O pai tentava recuperar o fôlego do riso. Com algum esforço lá conseguiu sentar-se no chão. “O nosso filho gosta de uma rapariga. Estava a ensaiar comigo o que lhe ia dizer”. Fez uma pausa para ganhar mais ar. “Então disse que ia ficar com ela para sempre”!

A mãe também se riu. Contudo, na sua sensibilidade maternal lá se foi abraçar ao filho. “Estou tão feliz por ti. Estás a crescer tão rápido e numa idade tão bonita”. Apertou-o entre os seus braços protetores. “A primeira paixão é sempre memorável. Mas tenho de te avisar que na adolescência apaixonamo-nos ‘para sempre’ uma data de vezes”. Explicou, enquanto o pai acenava com a cabeça em concordância.

“Quantas vezes achas, quer eu, quer o teu pai, nos apaixonamos eternamente por outras pessoas, antes de ficarmos um com o outro”?

“Não faço ideia.” Murmurou o rapaz um pouco envergonhado com aquela conversa tão íntima com os pais.

A mãe continuou: “Muitas! É uma altura tão bonita da vida. Deves aproveitar ao máximo e dizer aquilo que sentes. Só assim se aprende a viver”!

Por esta altura o pai já se tinha levantado e não ria como um maluco. Também se foi abraçar ao filho. “Vai lá dizer à moça que estás com ela ‘para sempre’. Se a coisa não resultar nós estamos aqui para ti e ‘para sempre’, nunca duvides disso”.


Conto elaborado para um desafio de escrita do site: Laboratório de Escrita 


sábado, setembro 24, 2022

Apetites violentos

Olhei para o espelho e encarei de frente o actor que me interpreta. Emprestou-me as feições e todo o corpo com o qual me exprimo. Mas eu não sou apenas uma imagem dele próprio. Conheço os seus segredos mais violentos. 

O interior do ser humano pode ser um baú onde se esconde muita obscuridade. O pensamento consegue alojar desejos absolutamente grotescos. Ocultar os instintos mais perversos. Encobrir apetites violentos. Tudo silenciado pela voz duma virtude mentirosa.

A aparência serve de camuflagem para encobrir estas verdades sinistras. Uma imagem limpa, elegante, bem-apresentada. Completa-se o figurino com um discurso educado, rodeado por uma simpatia natural, para cativar os outros interlocutores. 

Ele, espelhado no meu reflexo, sabe bem disso. As manhas usadas para cobrir as sombras. O perfume que mascara essa podridão. Algo mantido em silêncio pela boca, contudo, pronto a manifestar-se quando a oportunidade assim o permite.

Sorri-lhe maliciosamente pelo canto da boca. Não como juiz, mas como cúmplice. Ele sorriu-me de volta e juntos levamos o dedo indicador até aos lábios, murmurando um para o outro: “Shhhhh”…


sábado, setembro 17, 2022

Queda invertida

A personagem caiu ao céu. Bateu com as costas numa nuvem fofinha e partiu a espinha. Ninguém avisou sobre essas quedas, as quais podiam acontecer na direcção do azul do céu, ou como nuvens com aspecto de algodão doce podiam aleijar tanto. Muito menos alertaram sobre a existência de dores que nunca iriam sarar.

A personagem ficou perdida. Sem esperança, a olhar para a mentira à qual os outros chamavam de vida. Todos ensinavam às crianças porque não se deve mentir, mas a pior mentira é uma ilusão tida como verdade. Foi assim conheceu a palavra saudade. Aquela, de coisas nunca acontecidas.

A personagem soltou-se de volta para o chão. Desta vez não doeu tanto porque o chão é suposto ser duro. Aguentou a queda sem grandes lamurias. Como um verme, foi-se arrastando pela terra imunda. Implorou carinho a quem o pregava, sem nunca o receber. Ficou então a conhecer a palavra desprezo, juntamente com a hipocrisia.

A personagem escreveu o seu nome na lama para se lembrar que também tinha vida. Descobriu assim o poder das letras. Reparou, ao ler as palavras desenhadas na imundice, quando estas são usadas em conjunto, podem dar corpo à dor. Nas terminações formou rimas. E transformou, assim, em poesia toda a sua raiva.

A personagem rabiscou, então, sobre a queda invertida. De como partiu o alicerce da esperança, desde a coluna até à alma. Nunca conseguiu ser aquilo planeado por outros para si. Só uma sombra translucida, quebrada e deformada, sem nada a oferecer a quem carece de fantasia. Ainda assim, sentia um certo orgulho no seu falhanço.

A personagem quis então ser outra coisa. E foi. Livre da opressão de quem lhe indicava caminhos rumo ao vazio. Descobriu tanta coisa na vida para lá daquilo que julgava conhecer. Em cada novo pedaço de conhecimento, aumentou a sabedoria, só para descobrir de como era ainda enorme o tamanho da sua ignorância.

A personagem, depois, continuou. A viagem adivinhava-se longa, contudo, o destino era compensador. Olhou para trás, num breve vislumbre daqueles que ensinavam ilusões. Teve pena daquelas figuras ignorantes. Cativos no seu próprio mundinho preconceituoso. Sem a mínima noção de fantasia, ou pior, dos cenários existentes para lá do horizonte.


segunda-feira, agosto 29, 2022

A superioridade do polegar oponível

Gosto de ver a vizinha estender roupa. Fá-lo com gestos ágeis a denunciar uma mestria natural. Os pequenos pormenores tornam o processo hipnótico. Desde a sacudidela energética nas vestes, sempre acompanhada de um baque abafado, até à forma quase mecânica como coloca as molas na corda. Em pouco tempo fica tudo ao penduro, à espera que sol cumpra a sua função. Há uma pureza cativante em tudo isto.

É uma jovem adulta e mãe recente. Tem cabelo arranjado e usa um vestido fino de Verão que lhe facilita os movimentos despachados com faz a lida da casa. O visual dela é completamente moderno, no entanto, faz-me lembrar as mulheres de outros tempos. Aquelas que lavavam no rio, de lenço na cabeça, avental e saia comprida, como se vê nos grupos etnográficos, ou até mesmo como via a minha avó na labuta caseira.

Tudo completamente fascinante para um curioso do inútil como eu. Observo-a, sem qualquer malicia. Vou reflectindo sobre as suas acções. O porquê de tanto zelo na limpeza da roupa? Do cuidado nos afazeres que a habitação obriga? Isto, ao mesmo tempo que mantem a jovialidade, ao brincar com a criança ou no namoriscar do seu marido. Uma engrenagem fulcral no funcionamento da família, entre a mocidade e a responsabilidade.

Isto é a vontade da génese humana. Matrimonio, emprego, lar. Crescer, trabalhar, dar continuidade à sua linhagem através da prole. A sapiência divide-nos dos animais. Temos as nossas ciências, máquinas, dinheiro e conforto. A superioridade do polegar oponível. Porém, no essencial, será que existem diferenças de maior para com os outros seres com quem dividimos o mundo? Talvez a verdadeira liberdade seja constatar esta verdade.

A vizinha continua a estender a roupa. Os bichos a fazer coisas de bichos. Eu, no refúgio de pensamentos esdrúxulos, tão supérfluos quanto a existência. A realidade é diminuta para quem se alimenta de fantasia. Os cinco sentidos são tão limitados como uma prisão. Sobram as artes para dar continuidade aquilo que falta. A consciência, fertilizada pela inquietude, serve de ventre para a criatividade. Depois, como quem coloca as molas na corda, deixo as palavras ficar ao penduro, à espera de um leitor para servir de sol. 


domingo, julho 24, 2022

Como terminar uma relação

– Queres acabar comigo!? – bufou Sara com aqueles olhos enormes completamente abertos, sem pestanejar.

–  Sim – respondeu Joaquim, como quem está resignado.

– Espero bem que isto seja uma brincadeira! Investi vários anos nesta relação. Sempre fui bem clara ao querer construir um futuro contigo. Crescemos juntos até aqui e fazemos juras de amor praticamente desde a adolescência. Sacrifiquei-me e dei tudo de mim. Entreguei-me de corpo e alma e acreditava fazeres o mesmo. Criámos uma vida juntos, por amor de Deus! – lembrava Sara. – Agora estamos quase na meia-idade e acabas desta maneira!? – O tom danado da voz dela, juntamente com os olhos esbugalhados, quase tornavam a cena cómica, não fosse o facto de ela estar mesmo extremamente zangada.

– Não é uma brincadeira. Infelizmente estou a falar a sério – argumentou Joaquim.

– Por favor, dá-me uma boa explicação! – exigiu Sara, com o rosto a transparecer fúria.

 

Um dia antes

Não era comum ele andar de comboio. Detestava as confusões. Aglomerados de gente entretida com conversas banais. O Joaquim gostava da sua vida simples e amiga do ambiente. Nada de discotecas, festas, ou outras ocasiões com a participação de muitas pessoas. Adorava a sua existência pacata junto da companheira, Sara. Morava longe das cidades, onde não há pressas. Quando precisava de se deslocar, utilizava o seu carro elétrico, do qual tinha um particular orgulho, pois tinha-o comprado com as suas poupanças.

Naquele dia, como teve de tratar de uns assuntos naquela zona, mesmo sozinho, decidiu fazer uma viagem turística pela linha do Vouga. Alguém lhe disse ser uma viagem bonita, por paisagens naturais. Lembrou-se igualmente das histórias da avó, ela falava bastante sobre os passeios naquela linha “no tempo dela”. Esses argumentos despertaram-lhe a curiosidade e foi.

Ficou um pouco desapontado quando viu uma locomotiva a diesel, pois esperava uma clássica a vapor. Para compensar, as carruagens eram de madeira, completamente vintage. Cheiravam a antigamente. Reparou na grande quantidade de turistas a participar na viagem. Imaginava os passageiros de outros tempos, com roupas típicas, a deslocarem-se entre a casa e a cidade para trabalhar, sem imaginarem que no futuro aquela vida dura ia ser recordada como uma forma de turismo.

Entrou numa carruagem e sentou-se num banco qualquer. Imediatamente, um homem mais velho, possivelmente na casa dos sessenta, sentou-se em frente a ele. Vestia de forma peculiar. Usava um chapéu largo e um casaco castanho, apesar do dia estar quente. A primeira impressão de Joaquim foi a de ser um figurante, contudo o fulano pegou num caderno de apontamentos e numa caneta daquelas antigas, com recarga de tinta. O homem olhava em volta e ia escrevinhando enquanto o comboio seguia o seu trajeto. Aparentava não dar importância aos cenários por onde passavam, estava só concentrado na sua escrita.

Abstraído a olhar pela janela, Joaquim deixou de lhe dar atenção. Era de facto uma viagem bonita, como lhe tinham prometido. Só quando estava a chegar ao destino reparou no homem novamente e em como este o olhava com alguma curiosidade. Continuou a fixá-lo durante alguns segundos até escrever algo no caderno.

Na chegada, o homem arrancou uma folha e dobrou-a em quatro. Levantou-se logo de seguida e saiu apressadamente, deixando o papel dobrado no assento. Joaquim pegou nele e tentou localizar o homem entre o grande número de turistas a bloquear a saída. Não o conseguiu encontrar no meio de tanta gente. A curiosidade do Joaquim impeliu-o então a ler a folha esquecida. "Acaba com a Sara", dizia o bilhete.

 

De regresso ao presente

– Deixa ver se percebi! Vais terminar uma relação de anos comigo porque um idiota qualquer deixou um bilhete no comboio a dizer para acabares comigo! Não te parece ridículo? – Sara continuava incrédula. Mantinha os enormes olhos abertos, pareciam estar prestes a saltar das órbitas, tal era a fúria sentida por ela.

– Ainda não percebeste. Ele não era um idiota qualquer. – Joaquim fez uma pausa dramática. – Reconheci aquela caneta mais tarde, quando cheguei a casa, e não tive dúvidas.

– Como assim, reconheceste a caneta? Explica bem explicado!

Joaquim tirou um pequeno estojo do bolso. Abriu e mostrou uma caneta antiga.

– Deram-me este presente quando entrei para a escola primária. Na altura foi muito cara. A ideia era usá-la quando fosse adulto. Depois, com o surgimento das novas tecnologias deixei de escrever à mão e passei a fazer as minhas notas no telemóvel. Nunca cheguei a usar a caneta. Por isso, ficou escondida numa gaveta e já não me lembrava dela, até ontem. O homem usava exatamente esta mesma caneta. Sabes o que isso significa?

Sara não respondeu. Atónita, limitou-se a esperar a resposta.

Joaquim segurou a caneta diante dos olhos dela.

– Aquele homem era eu, vindo do futuro!


Conto elaborado para um desafio de escrita do site: Laboratório de Escrita 


quarta-feira, junho 29, 2022

Baseado numa história real

– Então deixa-me recapitular para ver se percebi! Tu vais participar numa competição de escrita, mas deixas tudo para o último dia? – disse ela preocupada.

– Exatamente. – respondeu ele com tranquilidade.

– Tu tens noção de que fazer as coisas à pressa e em cima do tempo pode correr muito mal? A isso chama-se procrastinação! O mais certo é qualquer dia falhares o prazo! – chamou-lhe a atenção.

– Relaxa. Tu stressas demais. Eu sou assim. Já sabes desta superstição. Tenho de mandar as coisas no último dia. Se possível, até no último minuto.

– Não tens medo de qualquer dia não entregares na data-limite?

– Se calhar até tenho, mas a minha imaginação só funciona assim, sob pressão. – Soltou um sorriso convencido – Até hoje nunca tive problemas.

– Estamos a falar de criar, escrever, fazer a revisão e enviar. Se juntarmos a isso tudo o teu trabalho, vida pessoal, passatempos, compromissos e para finalizar essa tua preguiça mundialmente famosa, muito me admira conseguires entregar as coisas a tempo e horas.

– Mas eu tenho essa superstição. Não posso fazer nada. Portanto, sou fiel a mim mesmo. Não vou mudar. Todos temos as nossas manias e eu não sou exceção. – teimou.

– Pois a minha superstição é fazer as coisas dentro do prazo e com atenção.

– Confia em mim. Vou enviar o conto dentro da data-limite.

O nosso suposto candidato a escritor em part-time respondeu assim à sua amiga. Estava plenamente confiante na sua habilidade de construir uma narrativa no último momento.

Por mera curiosidade abriu o Facebook e foi consultar as publicações guardadas. O prazo do desafio era até dia quatorze. “Ainda tenho tempo”, pensou confiante. Mesmo assim, olhou para o calendário do computador para confirmar a data atual. “Provavelmente devia estar para aí no dia cinco”. Julgou.

Olhou para o canto inferior direito do ecrã. Para sua surpresa já estava no dia quatorze! Engoliu em seco. Pegou no telemóvel para confirmar a data e de facto já estava mesmo no dia quatorze!

Nunca foi muito bom a saber a quantas anda, ainda por cima, nesta altura de calor e festas, perdeu completamente a noção dos dias.

– Foda-se! – exclamou! Já estava a meio da tarde. Se calhar não devia deixar assim tanto para a última. Afinal não tinha assim tanto tempo para trabalhar. Agora só havia duas soluções: desistir ou fazer jus à sua superstição de fazer as coisas mesmo em cima da hora.

Saiu e procurou um local entre a natureza. Sentou-se. Abriu o processador de texto do telemóvel e começou a escrevinhar ideias. Alguma coisa havia de fazer sentido no meio de tantas frases soltas.

Depois de uma horita debaixo duma árvore, à sombra, inspirado pela brisa fresca, lá conseguiu elaborar uma história. Contudo, ainda tinha até à meia-noite para enviar. Por isso guardou o ficheiro para fazer a revisão mais tarde. Tinha tempo suficiente.

Depois de jantar foi ver a Lua. Estava cheia, enorme e especialmente bonita naquela noite quente. Ideal para os românticos. Quando viu as horas, onze da noite, lembrou-se do desafio de escrita. – Bolas! – resmungou.

Lá correu para o computador. Fez umas quantas alterações e ficou satisfeito. Escreveu o e-mail, anexou o ficheiro e sentiu-se orgulhoso. Nesse momento reparou na data da mensagem enviada: “dia 15 às 00.01”!

Soltou o palavrão mais usado pelos portugueses. Tinha sido vítima do próprio tema do desafio: “Escrever um texto sobre uma superstição que se concretiza”.

Desta vez a superstição dele falhou por um minuto. Talvez para a próxima dê ouvidos à sua amiga.


Conto elaborado para um desafio de escrita do site: Laboratório de Escrita 


quarta-feira, junho 15, 2022

A brutalidade (O Narrador XV)


Já acordaste? Vê lá se te despachas porque estão-te a chamar.

Sim, sou eu, o teu Narrador! Estou de volta para traduzir em palavas os teus sentimentos mais agrestes.

Queres saber porque te vim acordar? É preciso escrever sobre “a maior lição que a vida te deu”. Não olhes assim para mim. O tema pode ser difícil, ou melhor, demasiado abrangente. Mas tu és capaz! Afinal de contas, já aprendeste tantas.

O sono das ilusões pode ser profundo. Existem até pessoas incapazes de despertar para a realidade. Sabes que doi. É uma coisa cruel! Bruta! Violenta! Completamente diferente daquilo prometido na infância pelos adultos. Grandes mentirosos! Sim, eu sei, não devemos usar tantos adjectivos, no entanto, o Narrador sou eu e escrevo como me der na real gana. As coisas são como são e as palavras existem para serem ditas. Mesmo que a verdade seja pesada demais!

Vamos lá! Não queres que comece aqui a bater tachos e panelas para te dar ânimo! Upa! É preciso escrever, mesmo com a alma a doer! (Olha rimou. Lembra-me para depois escrever um poema.) Adiante.

Qual é a lição que vais escolher: que a juventude não dura sempre? Que não somos imortais? Que os sonhos não são fáceis de alcançar? Que o amor dói? (isso acontece a todos) Outra coisa…

Sobre a amizade! Acertei?

Não me critiques por excesso de ques no texto. Eu sou só uma espécie de alter ego criado pela tua mente para dar aos teus pensamentos a capacidade de serem expressos por palavras. Talvez tenha alguma autonomia na minha própria vontade, mas sou só o Narrador da tua vida. Nada mais. Contudo, assumi esta missão de forma genuína. Não é suposto que escreva de maneira chique, mas sim, que deite cá para fora aquilo que te atormenta.

Bem, já acordaste qualquer coisa, ou pelo menos parece. Já consegues abrir os olhos. Hora de trabalhar, ou melhor, escrever. Vamos voltar ao tema central deste texto. Como a amizade pode ser falsa!

Tanta moral que anda por aí a pregar o valor da amizade. “Todos juntos vencemos qualquer mal” e coisas assim do género. Tretas inventadas para dar corpo aos argumentos de desenhos animados e histórias da carochinha.

Portanto, resumindo, lá estavas tu, com o futuro todo pela frente. Sem medo. Com a força toda dos heróis. Parecia um palco e tu lá no centro, para ser a atração principal numa peça majestosa. O cenário estava pronto. Era lindo. Os amigos estavam lá na plateia para bater palmas pela tua glória. Não havia nada que pudesse falhar, mas falhou! 

Sem saberes como, desmoronou tudo em cima de ti. Foi num instante. Sem avisar. Quando deste conta estavas debaixo do peso do entulho. Já não havia palco, só ruínas!

Ok, foi só um contratempo. Estavas de rastos, sem forças, ainda assim, não te faltava a esperança. Era altura de apelar aos valores da entreajuda, os mesmos que julgavas indiscutíveis. Chamaste pelos amigos que certamente viriam em tua ajuda. Afinal, nada podia parar a força da amizade!

Esperaste. Estavam a demorar. Esperaste mais um pouco e nunca mais chegavam. Continuaste a esperar. De vez em quando surgia uma voz a dizer “já vou”. Sem nunca vir. E tu esperaste…

Ao longe podias vê-los e escutá-los, ocupados com a sua própria vida cheia de alegrias, onde não havia cenários desmoronados, muito menos o teu nome presente nas conversas. Desviavam o olhar da tua direção com desdém. Como quem sente nojo. Talvez porque a consciência lhes doesse, ou porque a verdade sobre a fragilidade humana era violenta e cruel. O azar calhou-te a ti e o que eles tinham a ver com isso? Nada! 

Por causa desta lição, concluíste: A amizade é uma mentira!

Agora sobravas tu. Aos poucos, na tua solidão, foste afastando o entulho. Lambeste as feridas e continuaste. Depois, com a bagagem cheia de cicatrizes, já eras outra pessoa. Não tinhas amigos e não te faziam falta. Os outros, quem nunca veio para te ajudar, ficaram lá no passado. Foram material didático para uma lição bem dura.

Foste encontrando outros. Não exactamente amigos, mas companheiros de viagem temporários. Cada um com o seu destino, contudo, respeitavam-te, bem como tu a eles. Seguiram juntos enquanto os trilhos se juntavam, depois, separavam-se com um sorriso e um agradecimento. Ocasionalmente, um “até já”. Sem obrigações nem espectativas. 

Olhas agora para ti, um ser eremita assumido, com um grande orgulho nisso e outra tanta dose de amargura. Ergueste-te sem ajuda de supostos amigos e fizeste da solidão a tua maior força e companheira. Tornaste-te quase uma criatura misantropa, não por vontade própria, mas por imposição das ilusões da sociedade.

Talvez estejas a ter uma postura injusta, nem todos são assim. Apesar de tudo ainda tens alguns amigos e de certa forma mantêm-se fiéis, mesmo a conhecer essa tua mágoa. Lá encontram um pouco de empatia para te compreender. No entanto, já é tarde demais para reparar o dano, porque "o mal feito pelo homem não pode mais ser desfeito". Dás na mesma medida que recebes. Sem nunca esperar grande coisa em troca.

Essa é uma das lições mais duras que a vida te deu: a amizade é relativa, oportunista e falível. Só podes confiar em ti. Tão simples e tão triste quanto isso.


Texto elaborado para um desafio de escrita do site: Laboratório de Escrita 


sábado, abril 30, 2022

Duas Dimensões

– Achas que o gajo se drogou para pintar isto? – perguntou enquanto olhavam para o quadro, como se fosse uma tela de cinema.

– Não. Provavelmente viu uma pizza cair na esquina de um móvel qualquer e ficou com esta ideia em mente – respondeu enquanto comia mais uma pipoca.

– Uma pizza em formato de relógio?

– Não… – Riu-se. – Uma pizza redonda como as outras. Os relógios também são redondos, juntou as duas coisas e a ideia nasceu assim. As ideias aparecem dessa forma, ao juntar memórias.

– O Salvador Dalí devia ser do signo Peixes – comentou ao encher a mão de pipocas.

– Lá vens tu com os signos. Os Peixes não são os únicos capazes de criar surrealismo.

– Em matéria de criatividade os Peixes estão no topo da tabela do zodíaco. 

– Já vou ver – bufou. Mastigou mais umas pipocas, pegou no telemóvel e consultou a internet. – Nada disso. Onze de Maio. É Touro –concluiu.

– Então é uma surpresa. Não sabia que os Touros também fazem arte. Adiante. Gosto como de uma coisa em duas dimensões consegue representar um ambiente em três dimensões. Faz-nos viajar com a mente – reflectiu entre os estalidos do seu mastigar.

– É pena não conseguimos entrar lá dentro. Gostava de saber como funcionam as leis da física naquele sítio. Será que algum cientista já ponderou esse estudo?

– Lá estás tu a divagar. Isto é uma obra de arte, a ciência não tem nada a ver com isto. É para observar e pensar.

– Pensar no quê? – O balde de pipocas já começava a mostrar o fundo.

– Como a vida tem os seus limites e através da arte podemos tornar o irreal possível.

Nesse momento a conversa foi interrompida. Dezenas de polícias armados até aos dentes irromperam pela casa adentro.

– Mãos no ar, vocês estão presos pelo roubo no quadro “A Persistência da Memória”!

Riam como crianças enquanto obedeciam às ordens.

– Pois! Conseguimos roubar e só agora é que nos apanharam! E isto porque nós mandámos a carta com a nossa morada! – Riram-se ainda mais enquanto os polícias puxavam das algemas para os prender.

– Espero que a comunicação social esteja lá fora. Queremos ter o nosso momento de fama! – Gabavam-se com orgulho por terem conseguido fazer aquele assalto. – Considerem esta a nossa obra de arte!


Conto elaborado para um desafio de escrita do site: Laboratório de Escrita


terça-feira, abril 05, 2022

Sonho voador

 «Hoje é um dia memorável para a jovem República Portuguesa!». Os jornalistas presentes escutavam as palavras do novo Presidente da República, embora dividissem a atenção com o receio da plataforma onde se encontravam cair, pois ela elevava-se cada vez mais no ar como por magia.

O político, de pose orgulhosa, exibindo o seu bigode perfeitamente enrolado nas pontas, continuou a preferir o discurso triunfante. «Guardem na memória esta data na Primavera de mil novecentos e onze. Provamos, com esta tecnologia, sermos capazes de dominar os céus, tal como já fizemos com os oceanos e é com grande euforia que os convidei para esta viagem inaugural.» Apontou vitorioso para o navio alado, ornado com a bandeira Portuguesa, enquanto este se ia erguendo sempre mais alto.

Fez-se ouvir uma salva de palmas por parte dos convidados rendidos à admiração. O presidente chamou o engenheiro responsável por aquela majestosa máquina voadora. Era um rapaz bem vestido, sem qualquer tipo de pelo facial, algo raro naquela época. Mostrava-se envergonhado pelos aplausos. Agradeceu e explicou: «Os meus pares afirmam que motores de combustão são o futuro dos veículos de transporte, mas eu e a minha equipa conseguimos provar o contrário, nós tornamos o motor a vapor muito mais eficiente. Basta uma pequena chama de uma vela, ou mesmo um fósforo, para aquecer toda a caldeira de água. Não precisamos de ocupar espaço com combustíveis, podendo voar durante semanas e até meses. Aquece em pouco tempo e todo o calor gerado é aproveitado, maximizado e utilizado sem desperdício. Vossas excelências podem comprovar por vós mesmos. Por baixo do navio existem bolsas de ar quente fazendo-o subir como um balão. Quando chegarmos à altitude certa, aí sim, os motores vão ser ligados e fazer este magnífico navio alado, a que demos o nome de Dom Afonso Henriques, chegar ao seu destino, do outro lado do Atlântico, no Brasil.»

Os convidados e os jornalistas já começavam a ganhar um certo medo por estarem de pé em cima daquelas enormes asas triangulares. Para lá de possibilitarem o voo, também serviam de plataforma e de varanda, onde as pessoas apoiadas no corrimão podiam observar o mundo lá em baixo. Indiferente aos receios engenheiro continuou a explicação: «Também, devido ao seu desenho aerodinâmico ele pode planar como uma ave durante centenas de quilómetros, tornando-o impossível cair!» Ouviu-se mais uma grande ovação, sendo interrompida pela voz projectada nas cornetas de comunicação.

«Senhoras e senhores, daqui fala o vosso capitão. Chegámos à altura limite de segurança exterior e vamos preparar o voo a grande altitude. Pedimos a todos que entrem a bordo.» Eram dezenas as pessoas a passear pelas asas daquela embarcação aérea peculiar, com um formato pontiagudo na dianteira. Estavam maravilhadas por pairarem acima da cidade, com os habitantes a olhar para eles lá de baixo, perplexos.

O engenheiro indicou o caminho e, para alívio de muitos, entraram de forma ordeira, ocuparam os seus lugares nos quatro pisos do navio, divididos por áreas de lazer, descanso, suites, gabinetes e simples lugares de passageiros. Com todos já instalados no interior, ouviu-se o vapor a circular nos canos e os potentes motores começaram o seu trabalho, propulsionando a enorme aeronave pelo céu dentro, até chegar acima das nuvens. Os viajantes aproximaram-se das janelas, maravilhados pela paisagem. Era mágico. Assistiam a algo que acreditavam ser impossível. Muitos até julgavam estarem num sonho. Todos, sem excepção, elogiavam aquela máquina revolucionária.

Alguns graduados militares aproximaram-se do engenheiro, propondo, dada a capacidade de voo do navio alado, poder largar bombas sobre qualquer país inimigo a partir daquela altitude. O engenheiro declinou e afirmou: «O objectivo desta criação é unir o mundo e não destruir.»

Mais uma vez o capitão falou pelas cornetas: «A partir daqui vamos continuar a nossa viagem a planar, sem usar os motores, nem mais nenhum tipo de combustível, a não ser água e uma pequena chama acesa. Desfrutem a viagem.»

E assim, o ‘Dom Afonso Henriques’, imponente e seguro, tal como um pássaro totalmente confiante nas suas asas, atravessou o oceano Atlântico, por cima de todos os outros navios que navegavam pelo mar. Portugal voltava a fazer história conquistando desta vez os céus!


Conto elaborado para um desafio de escrita do site: Laboratório de Escrita


quarta-feira, janeiro 19, 2022

Sorrateiro e invisível

Olhou para o espelho durante alguns momentos, o mesmo para o qual tinha olhado antes daquela noite em que tudo mudou. Recordou-se das feições, da roupa que usava, do entusiasmo que sentia, mas principalmente da inocência daquele tempo em que a juventude era a sua imortalidade. Abandonou esses pensamentos e focou-se no agora. Abriu a porta de casa e observou a azáfama da cidade. O escuro já se fazia sentir, contudo era disfarçado pela iluminação das ruas. Parecia que continuava a ser dia a julgar pelo tamanho da multidão.

Saiu. Misturou-se entre eles. Era apenas mais um rosto entre tantos. Deslocava-se com rapidez, como um espectro. Uma sombra que surge no canto do olho e desaparece de imediato. Conhecedor da vida nocturna da cidade, depressa encontrou um trajecto que o levou aos becos menos movimentados. Sabia o seu destino e chegou até lá com ligeireza. Agora só restava esperar na penumbra duma esquina.

Ela apareceu. Uma mulher tão bonita. Cheia de juventude e de sonhos. Inocente, tal como ele já foi, sem saber o que a noite esconde.

Observou-a. Trazia um sorriso leve e vestia-se com tonalidades coloridas, como sempre. Era perfeita. Sabia isso desde o primeiro momento em que a viu e confirmava-o a cada vez que a seguia, pelas ruas da sua rotina que conhecia tão bem.

Aproximou-se por trás dela. Sorrateiro e invisível. Ela não o percebeu. Nunca o tinha percebido mesmo depois de ele o ter feito inúmeras vezes, como um ritual quase sagrado. Silencioso, chegou-se cada vez mais perto, a escassos milímetros. Podia sentir o perfume e o calor que emanava do corpo dela. Contemplou-lhe o pescoço longo, com a linha da jugular a insinuar-se entre o cabelo que dançava a cada passo que dava. Tão linda, tão perfeita, em cada gesto e cada traço.

Era difícil resistir à atração. Chegava a ser violento saber que podia tomá-la facilmente. Uma mão na boca silenciava o grito. A outra arrastava-a pela noite dentro. Podia ser dele. Toda dele. Mas hoje não… Como todas as outras vezes deixou-a ir. Amanhã voltava novamente para a idolatrar, seguindo-a em segredo e nas sombras.

Regressou a casa e olhou novamente o espelho. A ausência de reflexo incomodava-o. Restava-lhe a lembrança da sua imagem dos tempos em que era um jovem. Só isso. Um pequeno vínculo que o ligava à humanidade.

O dia aproximava-se e o vampiro abandonou aquelas memórias. Era hora de descansar. Talvez na próxima noite não fosse capaz de resistir à sede, ou talvez continuasse a fingir que também ele podia amar.


Conto elaborado para um desafio de escrita do site: Laboratório de Escrita


sexta-feira, janeiro 07, 2022

Coisas escritas

O Universo é uma narrativa escrita pela mão mágica dum criador.

Uma divindade estranhamente infantil.

Um Pai Cósmico de imaginação fértil,

Que, na sua fantasia infinita desenhou o mundo, do qual se fez editor.

E assim nascemos nós, como palavras escritas.

Vidas contadas entre derrotas e conquistas.

Curiosos, também ansiamos por criar histórias entre a dor e o amor.

Fazemos do mistério a nossa liberdade,

Traduzimos para palavras a nossa curiosidade.

Esquecemos as personagens que somos e ansiamos por algo maior.

Crescemos até ao expoente do pensamento,

Criamos Universos pela caneta do sentimento.

Nós, as palavras, o criador, rivais no mesmo carisma impulsionador!

Porque a imaginação não pode ser calada.

A inquietação jamais pode ser travada,

Sem medo do falhanço as histórias vivem pelas mãos de qualquer autor!

Sina desassossegada, sem nunca terminar.

Universo que acontece com tanto para contar.

Ideias que nascem como infinitos, paridas por gente, ou algum Deus escritor…


Poema elaborado para um desafio de escrita do site: Laboratório de Escrita


quarta-feira, janeiro 05, 2022

O monumento

A minha alienação é magnifica
Um monumento erguido à decadência
No alicerce da minha inexistência 
Ergo com orgulho esta construção épica
Olho de longe pelo óculo da malicia
Um mundo devotado à ignorância
Entrego-me ao conforto da preguiça
Dou aos homens a minha ausência 
Ofereço-lhes a minha negligência 
Paridos sem bom-senso e sem lógica  
Do ventre analfabeto da violência 
Deixo-os ir na torrente da demência
E guardo para mim o que a vida tem de mágica