terça-feira, janeiro 29, 2019

Semear temperos


Sobre a vida, malfadada na sua amargura
Do coração: colam fragmentos
Do corpo: gritam tormentos 
Da boca: calam lamentos...
Sobre a vida, amada na sua doçura
Do coração: sonham afectos
Do corpo: suplicam sentidos 
Da boca: desenham beijos...
Sobre a vida, encantada na sua candura
Do coração: guardam momentos
Do corpo: declamam sonetos
Da boca: semeiam temperos...
Sobre a vida, saboreada na sua aventura


sábado, janeiro 19, 2019

Depois do enigma desvendado


Lembras-te do dia em que venceste o caos pela primeira vez?
Tinhas definido para ti a sina da derrota. De tal maneira que te cingiste a ser uma sombra, sem qualquer tipo de vontade. Tal como um ramo caído, a flutuar ao ditar da corrente. Apenas abraçaste a mentira que as regras sociais te reservaram.
Ainda por cima elevaste a tua pena ao estatuto de grandeza e obedeceste: Amar porque é suposto. Trabalhar para ganhar o “pão nosso de cada dia”. Ir de férias como se tratasse de um prémio. Julgar, com tua opinião inútil, traços e condutas de outros, tão vazios como tu, tal qual uma forma de entretenimento.
Eras parte da ilusão e gostavas. No entanto, houve um momento de clareza, daqueles em que enfrentas a verdade olhos nos olhos e em frente ao espelho, abraças a conclusão de que não tens nada a perder. Foi então que decidiste ir ao encontro do desafio, tendo como munição somente os sonhos que julgavas impossíveis e uma réstia de vontade que ias guardando no baú da mente.
Foi esse o momento que até então julgavas impossível. Provaste a iguaria agridoce da vitória. Aliás, saboreaste em grandes garfadas o manjar violento do triunfo e apanhaste-lhe o gosto exótico. Tomaste consciência da tua própria força e domaste as regras do jogo que te subjugava. Soube bem, não soube?
Foste, com o medo calado, na direcção da tua aparente desgraça. Era o tudo ou nada! O fim ou a glória! Coisa nenhuma te travou, ninguém te fez duvidar. Agarraste, com a certeza que nascera em ti, a coroa do teu próprio reino. Mereceste. Conquistaste com dor e fantasia o que sempre te negaram.
Mas não acabou aí. Nunca acaba! O trilho de inimigos pela frente continua, tão imenso como o mundo, tão imprevisível como o mistério. O combate carece de estratégia. Há avanços e recuos. A guerra faz-se de fracassos e sucessos. Tu sabes disso. E sabes ainda mais que também és forte e indomável. Moldaste essa realidade desde aquele primeiro dia em que enfrentaste o caos e venceste. Porque afinal de contas, depois do enigma desvendado, tu és o próprio caos!

sábado, janeiro 12, 2019

Intempéries do sentir humano


Peço desculpa, mas hoje apetece-me amar.
Existe um excesso de ódio e repreensões, onde devia ser apenas a natureza a florescer. Arranham-me as vozes ásperas do julgar. Perde-se o sentido da razão, nos actos vazios de quem não sabe mais do que limites.
Inventam afazeres, veneram expectativas sem vontade própria. Cobrem a vontade de ruído e cansaço. Tenho de acordar. Nada em mim é assim básico. Assusta-me até o expoente do pavor absoluto, ser um igual aos demais em horizontes e sabedoria.
Há momentos em que todo o resto é efémero, apenas o amor se eleva como eterno. Por isso, não exijo mais do que um corpo para acariciar, uma boca para provar e uma outra alma onde viajar.
Só desejo que o tempo fique imóvel, enquanto a inocência regressa na sua juventude perpétua. Antes que a pele perca o tom imaculado e a vida nos relembre a mágoa.
Urge calar a dor. Esmagar a solidão com o peso desta minha rebeldia. Devo afirmar que não sou escravo de imposições ou entretenimento dormente. Existir sem tocar em sentimentos quentes não me satisfaz. Quero um pouco mais!
Este sou eu. Despido e sincero. Exposto às intempéries do sentir humano. Como um tolo irresponsável a bradar sem medo que todo o meu desejo é unicamente amar!
Esta é a minha pequena oração ao Universo, com todo o seu mistério. Sem o nome de Deus, ordem ou ciência. Só a religião imperfeita de quem está cansado da ausência do sonhar.