quinta-feira, dezembro 26, 2013

Apenas um sorriso


O vampiro estava escondido a observar o palacete. Decorria uma festa no salão de baixo. Havia comida, dança, sorrisos e conversas entusiasmadas. 
Os convidados chegavam em luxuosos automóveis. As mulheres, com corpos esculturais, exibiam vestidos luxuosos, cabelos artisticamente penteados e jóias brilhantes. Mesmo ao longe conseguia sentir o perfume delas como se fosse um convite. Os homens, esses, ostentavam fatos elegantes, devidamente aprumados, mostrando uma postura confiante típica de quem é bafejado pela riqueza.
Contemplava o que se passava lá dentro. Principalmente a forma jovial como dançavam ao som de uma pequena orquestra. Os passos bem treinados, os rodopios e principalmente a alegria que os pares sentiam, fizeram com que o vampiro desejasse estar lá dentro. Imaginou-se numa valsa a conduzir uma jovem de grande beleza e a ser o centro das atenções.
Naquela noite não queria sangue. Desejava apenas um sorriso. Um singelo sorriso que fosse verdadeiro. Era apenas isso que ansiava. Somente um sorriso.
Podia tentar entrar mas assim que os seguranças o avistassem iriam, certamente, confundi-lo com um velho mendigo, senil e sem-abrigo. Aquela gente não suporta pedintes. Seria escorraçado como um cão sarnento. Ou pior. Ninguém ia acreditar se dissesse que apenas desejava um sorriso.
Isto é. A menos que uma alma malfada o olhasse nos olhos e visse as trevas que se escondem no seu íntimo. Sentiria um terror absoluto. Até o mais forte dos homens treme perante a imagem de um monstro assim. Mesmo assim iriam atacá-lo. Teria de ser violento. Podia vir um, dois, três, dez, vinte, cem, duzentos, mil… Tanto faz. Todos iriam morrer pelas suas mãos. Tinha sido amaldiçoado pelo diabo (ou algo pior) e a sua sina era matar.
O vampiro manteve-se escondido a observar a festa. Naquela noite não queria sangue. Desejava apenas um sorriso. Um simples vislumbre de carinho por mais insignificante que fosse. Seria pedir demais?
Naquela noite tudo que o vampiro queria era um pouco de amor que lhe aliviasse o fardo, imensamente pesado, da solidão. Naquela noite o vampiro não queria matar, mas como em tantas outras, teria de cometer uma atrocidade e verter sangue inocente…

sexta-feira, dezembro 20, 2013

Paralelismos

I
Olhou para cima e reparou nas longas escadas que levavam ao cimo do prédio.
A escadaria que levava ao último andar era comprida e com toda a certeza cansativa.
II
Colocou o pé no degrau e deu o primeiro passo de muitos daquela longa subida
Respirou fundo, engoliu em seco e começou a subir lentamente degrau atrás degrau.
III
Seguia devagar enquanto procurava limpar a mente de qualquer tipo de pensamentos.
Sentia um turbilhão de emoções, não sabia o que esperar, a ansiedade tomava conta de si.
IV
No fim da demorada subida sentiu um medo gélido a acompanhar a respiração ofegante.
Caminhou lentamente até ao topo mas isso não impediu que acusasse o cansaço.
V
À sua frente estava a porta do apartamento sem saber o que o esperava lá dentro.
Olhou para a porta do apartamento e tremeu. O que estava lá dentro era uma incógnita.
VI
Levou a mão ao bolso e tirou a chave que guardava esperando nunca ter de utilizar.
Abriu a bolsa e procurou a chave. Não podia hesitar por isso meteu-a na fechadura.
VII
Rodou a fechadura e a porta abriu soltando um ranger que acusava falta de uso.
O ranger fantasmagórico que se ouviu quando empurrou a porta fê-la estremecer.
VIII
Lá dentro, por entre a obscuridade, distinguiu um vulto feminino caído no chão.
Um corpo masculino que jazia no chão distinguia-se na sala pouco iluminada.
IX
O seu coração parou perante o cenário e uma lágrima começou a escorrer-lhe pela face.
O seu coração disparou perante o cenário e um sorriso aberto pintou-se no rosto.
X
Baixou-se acariciando o rosto da mulher que parecia dormir, beijando-lhe os lábios frios.
Baixou-se e levou os dedos à testa do homem sentindo o buraco da bala que o matara.
XI
Depois pegou-lhe na mão delicadamente e tirou-lhe um anel que parecia ter luz própria.
Depois, do pescoço do cadáver arrancou um fio de ouro. Enfim tinha sido feita justiça.
XII
Saiu de seguida fechando a porta atrás de si na esperança de esquecer aquele lugar.
Saiu de seguida fechando a porta atrás de si, finalmente podia sentir verdadeira paz.


Gostava de ver alguém construir a sua versão...

quarta-feira, dezembro 18, 2013

Só para lembrar

Transcendente foi o nome que me deram numa brincadeira, porém nada acontece por acaso e transcendentes são os meus sonhos, que viajam através das eras, ultrapassando o limite da imaginação, percorrendo o infinito…


Já lá vão uns anitos mas acho que ainda se adequa
Um dia reescrevo...



sábado, dezembro 14, 2013

Olha uma coisa!

Pedes-me para escrever de maneira diferente? Coisas diferentes também? Tanto tempo aprumar a escrita e agora dizes-me isso! Quando já tenho um estilo, um bom domínio, um ritual, é que me dizes para escrever de maneira diferente?
Nem sei que diga… Ou faça… Ou escreva!
Porra!
Agora deixaste-me a reflectir


Tenho um padrão um estilo um bom domínio um ritual sempre igual
Estagnei
Não evoluo

Embora pareça e seja diferente para os outros não o sou para mim
Portanto criei limites onde não deviam haver nenhuns
Tenho de desfazer o que foi feito para me reencontrar
Ok
Seja

Impressionante como agir de forma diferente pode ser difícil
Como se estivéssemos tão acostumados às amarras que as déssemos como algo normal e imutável

NÃO ACHAM?

Regredi evolui mudei não sei
Não enlouqueci disso tenho a certeza

sábado, dezembro 07, 2013

SUSSURROS


Sussurra-me ao ouvido coisas banais, a mim vão soar como todos os segredos das estrelas.
Amo-te como quem ama o desassossego pois quando te toco tudo em mim é combustão. 
Contigo o silêncio fala e cada toque é inflamado com desejo. 
O mundo não me basta, quero sempre mais e só o turbilhão de emoções dos nossos corpos unidos em prazer consegue apaziguar a minha inquietude. Por momentos... Pois logo a seguir tudo volta. Sou eternamente insaciável!
Matas-me a fome em instantes eternos com o sabor do teu corpo e da tua alma e sacio-me aos poucos, a desejar nos entretantos sempre mais...

sábado, novembro 23, 2013

MIL SENTIMENTOS JUNTOS


Refugiei-me no poema
Em busca de uma certeza
Ou de um aconchego talvez
Deixei-me ir pelas palavras
Mas rimas não encontrei
“Poeta não sou”, concluí
Continuei no entanto
Algo havia de surgir 
Entre os escritos que vinham
Ou se calavam 
Será isto um desabafo
Uma oração
Inquietação
Ou uma perca de tempo
É uma incerteza
Um grito furioso
Um gesto carinhoso
Mil sentimentos juntos
Mil vozes que não consigo calar
Mil eus numa só vida
Mil forças inabaláveis


sábado, novembro 16, 2013

NUNCA É TARDE


Nunca é tarde para começar uma aventura.
Nunca é tarde para aprender coisas novas.
Nunca é tarde para descobrir as maravilhas do mundo tal como uma criança inocente.
Nunca é tarde para se ser jovem, ainda que as rugas no rosto e a energia que se gasta acusem o passar dos anos.
Nunca é tarde para amar sem limites, com promessas tontas e romantismos poéticos.
Nunca é tarde para fazer a diferença no mundo, no teu, no meu, no de todos. Mesmo que milhões de forças digam que não.
Nunca é tarde para brincadeiras e loucuras desvairadas que geram gargalhadas e boas histórias para contar.
Nunca é tarde para te recriares, renasceres e transformares.
Nunca é tarde para sentires! Ódio, raiva, tristeza, emoção, glória, conquistas e apoteoses!
Nunca é tarde se a tua mente vibra, anseia e ferve de desejo de viver!


sábado, novembro 09, 2013

PORTAS DA FANTASIA


A chuva que caia lá fora fez com que se recolhesse ao conforto dos seus aposentos. Sentado na poltrona deixou-se tomar pelo calor que provinha da sala. As suas pálpebras começaram a cair. O corpo foi ficando relaxado e o sono não tardou em chegar.
Foi assim que entrou de mansinho no mundo dos sonhos. Atravessou as portas da fantasia pairando no seu voo pelo imprevisível. Conhecia bem aquela sensação em que a voz de Morpheus o atraía, ao mesmo tempo que lhe sussurrava segredos encantados sobre o universo.
Aquele era o seu verdadeiro refúgio. Nas profundezas do adormecer, nos mistérios da sua própria mente embalada por magia. Perdido algures por entre os mundos infinitos que se escondem no seu sono ele encontra-se a ele mesmo. Já não é um simples individuo. Torna-se num ser encantado sem limites nem fronteiras, sem tempo ou medos, onde tudo se transforma em descoberta.
Então chegou o acordar. Os seus olhos abriram-se trazendo-o de volta ao nosso mundo. Um breve momento de confusão prendeu-o entre as duas realidades. Queria ficar onde estava, entre os sonhos, mas não teve outra opção senão despertar. Tinha de ser. Tinha a certeza que em breve ia voltar. Aliás, aquele seria sempre o seu refúgio, para onde voltaria vezes sem conta sem que os outros o soubessem. 
No entanto, por agora era altura de acordar. Sabia que tinha em si conhecimentos que o engrandeciam e uma vontade indomável de viver…


sábado, novembro 02, 2013

MUITAS PERGUNTAS


– Acredito no dia de hoje. – Respondi.
– Viver como se não houvesse amanhã? – Perguntou.
– Nada disso. Pelo contrário. Viver todos os dias de forma a plantar um amanhã melhor. Preenchido com histórias, aventuras, sabedoria, magia… Livre das amarras da banalidade.
Riu-se. – Parece palavreado de um livro de auto-ajuda.
– Agora que falas nisso, suponho que sim. – Ri-me também. – Mas não me importo, é nisso que acredito.
– Acreditas em magia? – Perguntou. Os seus olhos adquiriram um brilho cristalino. Típico de quem fica empolgado perante uma aventura.
– Estás a fazer muitas perguntas hoje. – Disse em tom de gozo.
– E tu não respondeste. Acreditas ou não?
– Sim. Acredito. – Respondi desviando o rosto na direcção do céu e observei as nuvens primaveris. A sua beleza parecia saída de uma pintura.
Creio que percebeu que respondi de forma evasiva. Talvez devido a isso esperou um pouco antes de voltar a falar. Possivelmente para avaliar o que ia dizer a seguir. Sabia que não me devia pressionar. Detesto isso. Deu mais um gole na bebida e chegou-se ao pé de mim sussurrando, como se contasse um segredo:
– Sabes, às vezes acho que és um ser mágico…
Respondi-lhe com um sorriso. Creio que compreendeu o meu silêncio. Os seus olhos brilharam ainda mais e as suas bochechas adquiriram um tom avermelhado. Levou novamente o copo à boca numa tentativa vã de esconder o rosto. Corou. Mas não foi de vergonha. Acho que foi de orgulho de ter tido a coragem de me dizer aquilo.
Senti que devia dar-lhe uma recompensa pela sua audácia. Por isso disse-lhe:
– Todos somos mágicos. A maior parte de nós não sabe, nem acredita nisso, mas é verdade. Todos temos magia. Basta perder algum tempo a procurar por ela…
– E como podemos procurar por ela? – Aparentemente as minhas palavras soaram-lhe a frases feitas e pareceu sentir algum desapontamento.
– Essa é a pergunta que todos fazem. – Respondi, fugindo um pouco ao assunto.
 É a pergunta que tem mais lógica. Como podemos encontrar a magia que há em nós?
Reparei no seu rosto curioso e senti uma divisão em mim. A resposta é tão simples que a maior parte das pessoas acha-a ridícula e pura e simplesmente não acredita. Fiquei a ponderar se lhe dizia ou não…


sábado, outubro 26, 2013

BRUTO


Fúria maldita! A raiva toma conta de mim como um fogo que me assoma e tenho inveja de quem sente tranquilidade. Hoje tudo em mim é ódio! Tanta gente no mundo, tantos dramas com eles… Posso ser apenas mais um e se calhar no meio de todos sou apenas ninguém, mas permitam-me ser egoísta: sinto-me, irado, raivoso, violento, bruto e monstruoso! Exijo justiça sem remorsos, sem perdão… Não aceito desculpas por parte de quem me ofende! Quero que padeçam! Simplesmente isso!
Quanto a mim, apenas desejo voltar para a serenidade…


sábado, outubro 19, 2013

SIMPLES AVENTUREIRO


O mundo está cheio de pequenas histórias. Cada um de nós vive centenas por dia, quase sem nos apercebermos. Aventuras simples que rapidamente passam ao esquecimento. Pessoas que se cruzam connosco e se juntam a nós para um mero acontecimento. Desde um simples "olá", a um trocar de olhares; uma conversa sobre o tempo ou um mostrar de indignação sobre a crise; um café relaxado logo a seguir ao almoço na pausa do trabalho, ou um gesto de entreajuda num momento de necessidade; enfim, um infinito de situações impossíveis de enumerar a todas.
Depois de analisar isto chego à conclusão que tenho a vida preenchida por "pequenos nadas" sem o perceber na maior parte do tempo. Sou um aventureiro do dia-a-dia. Protagonista de modestos acontecimentos sem ter a emoção para os notar.


sábado, outubro 12, 2013

COMPARANDO INFERNOS‏


O meu inferno é gélido. Insensível, dormente e sem emoções. Toma-me o corpo e a alma, arrastando-me para uma solidão devastadora onde os sentimentos são uma miragem.
O meu inferno é um palco onde enceno os guiões da personagem em que me tornei. Nele existe uma balança que pesa as acções de quem contracena comigo, às quais respondo como justiceiro, amante ou mero observador.
O meu inferno é um paraíso onde o bem e o mal não existem. Um lugar onde os outros me tocam mas eu não os sinto. Limito-me a retribuir aquilo que recebo. Sejam olhares, carinhos, dores ou vinganças.
O meu inferno é um abismo em que o fim é o desconhecido. Nele consigo voar com as asas da fantasia e esqueço que o medo existe. Conheço mundos, pessoas e histórias que rumam ao mesmo destino que eu.
O meu inferno é meu, apenas meu. Diferente do teu, diferente dos outros, pois nenhum inferno é igual. Cada um é único tal como cada coração, ora amargo, ora doce, ora feio, ora belo, ora cheio de sonhos, ora vazio e sem interesse.


sábado, outubro 05, 2013

INFINITAMENTE PEQUENO


Sentei-me no topo do mundo e observei a humanidade.
Tudo parecia infimamente pequeno. De uma insignificância total, diria mesmo ridícula.
O tempo acelerou e as eras foram passando cada vez mais rápido. Assisti a guerras que se transformaram em amizades, que mais tarde se tornaram novamente em quezílias.
Vi gentes a crescer, viver e morrer. Assim como impérios, reinos, religiões e ideias. Tudo o tempo trouxe, tudo o tempo levou, tudo o universo esqueceu.
Reparei que os acontecimentos surgiam em ciclos que iam e vinham. Os intervenientes eram sempre diferentes, os locais também, mas as ocorrências eram iguais.
Naquele sítio entre o sonho e a realidade apercebi-me que também eu fazia parte daquele espectáculo sem objectivos. As coisas iam e vinham sem nunca prevalecer. Cheguei à conclusão de que eu era igualmente nada no meio daquele emaranhado de existências sem importância, se comparadas com a imensidão do infinito.
Parecia um destino triste. No entanto eu sou dono das minhas ilusões e essas ninguém mas pode tirar. Por mais inúteis que possam parecer aos outros, para mim são o meu tesouro…


sábado, setembro 14, 2013

POR ENTRE A TEMPESTADE


O Deus do Trovão surgiu nos céus, entre as nuvens carregadas, fadado com todos os nomes que os povos e os tempos lhe deram. Trouxe consigo o medo que a sua presença anuncia, crivando de terror a coragem dos heróis e enchendo de suplicas a boca dos humildes.
A sua figura austera olhou para o mundo com um semblante indecifrável entre a melancolia e a raiva. Sem hesitar, elevou a sua mão e por entre o negrume chamou a tempestade. Então, no meio da obscuridade que se formou, nasceu um relâmpago que rasgou a as trevas com a sua luz tenebrosa.
A terra estremeceu ante o poder daquele raio implacável e do seu som aterrador. Lágrimas jorraram dos olhos das crianças e os corações dos adultos dispararam no seu bater acelerado. Era o pânico a ganhar vida.
Mas a intempérie não se calou. Os céus assombrados eram trespassados cada vez mais e mais pelos trovões impiedosos que ribombavam sem misericórdia, clemência ou compaixão. O terror, o pranto e o desespero faziam-se ouvir no pavor dos humanos assustados.
O Deus do Trovão observou a sua obra no seu voo sublime. Quando o medo no mundo alimentou a sua ânsia ele baixou a sua mão, chamando de volta o sol, que foi regressando submisso por entre a tempestade que se acalmava. 
Depois de demonstrar o seu poder, foi embora. Tinha lembrado que a natureza é mais forte e as pessoas meros seres piedosos por um pouco de felicidade…


sábado, setembro 07, 2013

REFLEXO


Os espelhos estão em todo o lado mas não reflectem a minha imagem. Quando os olho, não é a minha figura que olha de volta para mim. No seu reflexo fico transparente, dissolvido, inexistente! 
Aparecem em várias formas, vários feitios ou mesmo em materiais improváveis. Por vezes surgem sob a forma de som, outras como um sussurro trazido pela brisa, outras como uma certeza que inunda a minha intuição. 
São como retrovisores que mostram o que está por trás de mim. Onde está apenas vossa vida que vou observando quando pensam que não estou a ver.
Quando estou de costas vocês julgam-me ignorante, inocente, sem interesse. Mas desconhecem que eu estou a observar no silêncio da minha quietude. Sei os vossos segredos mais negros. Conheço as vossas manhas ludibriantes. Sinto o vosso cheiro a podre a entranhar-se no vosso olhar…
Não me pronuncio sobre isso, mantenho-me calado alimentando a vossa certeza sobre a minha ignorância. Oh… como estais errados. Sei tudo aquilo que cultivam no oculto. Os espelhos contam-me tudo em pormenores sórdidos e grotescos.
O meu silêncio protege-me da vossa malícia. Escondo-me na minha suposta inocência e guardo as vossas misérias para um momento oportuno. Até porque a vossa vida não é assim tão interessante, embora tenham essa ilusão. São meras existências banais, insípidas e sem conteúdo, que se entregam ao pecado como qualquer outro humano. (Eu não sou excepção).
Portanto mantenham as vossas rotinas vulgares. As vossas mentiras mundanas. Mesmo que de forma inebriada achem que vivem acima dos demais. Lembrem-se apenas:
Eu sei…

sábado, agosto 31, 2013

QUARTA DIMENSÃO‏


Algures num adormecer, olhei para dentro de mim e encarei o caos da minha insignificância humana. Mergulhei para dentro do transe em busca do infinito que há em mim, para alem do meu corpo, do meu íntimo, do meu tempo… Na direcção da essência do meu eu, em busca da fonte onde o próprio universo nasce, para além de qualquer conhecimento.
Nessa procura íntima, em que a minha mente seguia num voo imaterial que era um misto de sonho, profecia e imaginação etérea deixei-me perder algures entre a sonolência e o pensamento. Até que subitamente fui atingido por uma energia desconhecida que me fez despertar de forma instantânea. No entanto, ao voltar à realidade algo estava diferente: foi como se dois mundos coexistissem num só.
Vi-os a convergir, como duas imagens que se sobrepõem, transformando-se apenas numa. A nossa existência em simbiose com outra, numa comunhão assustadora.
Edifícios de arquitectura estranha elevavam-se entre os nossos desafiando as leis da física. Seres de aspecto bizarro, no entanto belo, passeavam-se entre nós. Eram parecidos connosco, era como se a nossa raça tivesse evoluído em várias espécies diferentes e eles fossem o resultado. 
Para aquelas gentes, a ciência era avançada e confundia-se com magia. Fiquei muitas vezes na dúvida se era uma coisa ou outra. Não era algo que parecia saído de um filme de ficção científica, mas de uma evolução natural que aquela civilização tinha sofrido.
Os seres olhavam-nos e conduziam a sua vida normalmente, cientes da nossa presença. Aparentemente sem se importarem, como se fizéssemos parte do seu dia-a-dia. Mas nós não os víamos, nem tínhamos consciência de que eles estavam lá.  Circulávamos na ignorância de que todo aquele mundo nos rodeava, se fundia com o nosso e fazia parte do universo em que habitamos.
Veículos voadores circulavam os céus vindo e indo para destinos longínquos. Embora tudo ali parecesse próximo. Extremamente próximo! Os próprios planetas do sistema solar pareciam estar mesmo ali à beira, à distância de um esticar de braços. O espaço entre eles, apesar de enorme, tal como o conhecemos, era ao mesmo tempo curto sem que eu conseguisse explicar como. 
Quase todos estavam inundados de vida. Habitados por criaturas maravilhosas que tinham tanto de magnifico como de assombroso. Existiam, também, mais planetas, todos em comunicação constante devido à proximidade que anulava as nossas leis da física.
Não tinha explicação lógica para a minha visão daquele mundo surreal paralelo com o nosso. Talvez o meu transe me tenha elevado para um estado alterado da mente, onde novos sentidos me permitiam ver o que um humano, na sua ingenuidade, não consegue;
Talvez aquela realidade, que se mistura com a nossa, fosse a mítica quarta dimensão, que os cientistas tanto almejam encontrar em complexas equações matemáticas e de que alguns místicos tanto falam nas suas palestras esotéricas;
Ou talvez, fosse tudo fruto da minha imaginação tomada pela insanidade!
Foi então que senti a energia a atingir-me novamente. Despertei de forma instantânea a meio de um momento banal. Perdi a noção de quando e como aquela imagem utópica aconteceu embora me sentisse totalmente dominado por ela.
Entretanto a visão foi desaparecendo lentamente, desfazendo-se em fragmentos que se vão perdendo na memória. Recordações que se dissipam como o nevoeiro na manhã acabando-se por perder entre o real e a fantasia. 
Não sei se era sonho ou lembrança… 


sábado, agosto 24, 2013

PALAVRAS A TI


Caro amigo (ou amiga) que visitas este recanto.
Escrevo-te estas palavras, não porque tenha algo a dizer-te, mas simplesmente porque quero expressar os meus devaneios bizarros a alguém, não sei quem. Fazer um desabafo desprovido de julgamento alheio, pois só quem nutre por mim verdadeira amizade não me vai sentenciar pelos meus pecados, ou simplesmente pelas minhas acções.
Não sei o teu nome, tu que te perdes nestas linhas, nem conheço o teu corpo. Tanto melhor. Assim não te avalio. Não és um objecto, nem um mero ser físico derreado sobre o peso de estereótipos, preconceitos ou regras pré-concebidas pela nossa sociedade imaculada (ou degenerada)…
És muito mais que isso. És ideias, sonhos, emoções, histórias para contar, objectivos a atingir, lágrimas e conquistas… És um mundo cheio de vida que partilha comigo este momento onde a leitura constrói uma ligação entre os nossos intelectos e o anonimato fortalece o nosso laço.
Raramente me expresso sobre a amizade; talvez porque não me sinta dependente dela; talvez por me poder dar ao luxo de usar a solidão como escolha e esta não ser para mim um duro castigo que a vida impinge. Para mim é uma hipótese de me restabelecer da confusão que as pessoas criam à minha volta com as suas banalidades. 
Não é que me queixe, até porque ter gente à nossa volta é uma bênção. Aqueles que vivem isolados forçadamente sabem dar-me razão. Também passei por essa estrada.
Só que interagir com os outros, ou melhor, estar dependente deles e do seu afecto pode trazer inúmeros dissabores, desilusões e amarguras. Tudo isto porque esperamos demasiado deles, quando não têm a obrigação de nos reverenciar. Por isso escolhi a alienação. Afastar-me da extrema necessidade de afeição. Assim encontrei a liberdade.
No entanto, não deixa de ser estranho que num momento de recolhimento pessoal partilhe contigo, meu amigo, este pensamento transcrito nesta carta. Que nada mais é do que uma troca em que ofereço as palavras e tu a compreensão (ou aceitação).
Agora, a ti, que não sei quem és, deixo-te o meu Bem-haja pelo tempo dispensado e a atenção que me dedicaste. Quem sabe um dia não poderei retribuir…


sábado, agosto 17, 2013

A PEÇA


Foi assim que aconteceu.
Depois de um começo inesperado e grandioso, em que o público ficou abismado com tamanha entrada imponente. Assombrados pela ousadia da primeira cena em que, vinda do nada, a acção começou rápida, empolgante e surpreendente. 
E foi correndo o enredo, entretendo o passar do tempo. Com fantasia, impulsos de energia a emanar dos intervenientes, entre lutas, dramas e paixões. Agarraram aquela história épica com força, como parte da própria vida e entregaram-se sem medo.
Foi sempre a crescer até à apoteose final. A plateia levantou-se em uníssono rendida à encenação. Emocionados ecoaram um ensurdecedor coro de aplausos perante a magnificência do momento.
E assim terminou. 
A cortina voltou a abrir e os actores regressaram ao palco, para com uma vénia ouvirem mais uma vez as palmas a aclama-los num último momento de apreço. Depois retiraram-se para os camarins. Era a altura de descansarem, gozarem o sucesso, celebrarem, para em breve voltarem a abraçar um novo argumento. 
Quanto ao público; uns saíram de imediato já com a mente fora do teatro de regresso às suas vidas; outros foram-se retirando devagar enquanto comentavam a qualidade do espectáculo e os seus maravilhosos pormenores; alguns ainda ficaram sentados a encarar o palco, onde a cortina fechada anunciava a falta de intervenientes. No entanto, aqueles espectadores, mantinham-se no seu lugar, talvez com uma ínfima esperança de que as personagens voltassem para dar continuidade àquela peça de teatro que os transportou, durante algum tempo, para longe da rotina, ainda que no papel de observadores. Eventualmente, também estes vieram embora. Tinha de ser. Nada mais existia ali para eles.
Passado tudo isto, restou a memória, para quem queira lembrar.


sábado, agosto 10, 2013

LINGUAGEM ILUMINADA


A Estrela surgiu no céu antes que o negro da noite tomasse conta dele. Foi a primeira a aparecer enquanto dia se calava e a sua luz se recolhia.
O seu brilho era intenso e de um fascínio hipnotizante, talvez por não existir mais nenhuma plantada no céu nocturno. Ou simplesmente porque era mesmo assim, feiticeira.
A sua beleza iluminava os olhos de quem a olhava. Artistas, poetas, pintores, músicos, gente com desejos e paixões, ou simples pessoas normais que queriam algo mais na vida. Todos paravam a contemplar estrela. Todos ouviram o que ela tinha para dizer. Palavras mágicas cheias de fantasia, de vida, de esplendor. Coisas que só um astro que vive no cosmos, muito para além deste mundo, pode falar na sua linguagem iluminada.
Entretanto a noite tornou-se rainha e a sua escuridão tomou conta dos céus, trazendo consigo muitas mais estrelas, cada uma com a sua luz.
Aquela, a primeira a surgir, pareceu ficar ofuscada, talvez por ser tímida e ter vergonha das outras. Vergonha de fazer os homens sonhar com o seu brilho repleto de emoção, magia e infinito…


sábado, agosto 03, 2013

PRIMAVERA PESSOAL



Renovar é necessário de vez em quando. É uma espécie de renascer. Crescer novamente mesmo sendo adulto. Voltar a ser criança e redescobrir o mundo. Os nossos brinquedos sendo novas filosofias. Os contos de fadas, esses, somos nós que os fazemos, sem castelos nem reinos encantados. Esquecemos que precisamos de ser príncipes e princesas, para sermos simplesmente felizes. Mas nunca deixamos de querer descobrir novos tesouros feitos de paixão.
A energia cósmica precisa de ser renovada no nosso ser. Limpar a nossa existência de impurezas e expulsar os medos que nos escravizam. Deixar que novas forças corajosas nos preencham.
Venham novas ideias, novas posses, novo visual, novas pessoas, novas coisas, novos mundos, nova vida… Morrer como a natureza no inverno e renascer numa primavera pessoal. Florescer com novas cores e novas formas.
Crescer, descobrir, evoluir e partir em frente para conquistar a imensidão do mundo. Pois, também nós somos feitos de ciclos em que a renovação se torna necessária, para que a vida não fique estagnada como aguas que vão ficando turvas e não saem do lugar.


quinta-feira, agosto 01, 2013

ANIVERSÁRIO


Hoje sou eu que escrevo sobre mim mesmo. Eu, aquele a quem deram o nome de “Transcendente” numa brincadeira. Não sei porque continuo a usar este nick. Nostalgia talvez, ou se calhar uma enorme teima em criar e manter uma persona na internet. Uma espécie de alter-ego para fugir à rotina.
Hoje reparei, por acaso, que este cantinho perdido na rede, onde deposito os meus pensamentos, devaneios e pequenas histórias, faz 8 anos. Voltei atrás às primeiras publicações e dei por mim a fazer uma verdadeira viagem no tempo. Existem inúmeros textos que já não me lembrava ter escrito. Alguns de muita fraca qualidade, hoje não os escreveria. Outros de pura genialidade, quase que parece que não fui eu que escrevi. Mas os momentos de criatividade saíram da minha mente e desaguaram em palavras.
No entanto todos os textos têm algo em comum: Surgiram inspirados por pessoas, situações, ou fantasias que nasceram das entranhas da minha criatividade. Ao reler do início pude reavivar a memória que o tempo se encarregou de arrumar num canto esquecido da minha mente. 
Rostos que se cruzaram comigo e partilharam um pouco da sua vida, seguindo depois os nossos caminhos que se foram afastando até estarem demasiado longe. Acontecimentos que vivi ou presenciei, pois nem sempre fui eu o protagonista, apenas mero observador e sobre eles opinei ou tentei transformar em poesia. A minha imaginação a voar, livre, maravilhada, solta pelo infinito a descobrir segredos ocultos e a acumular conhecimento…
A cada publicação lida relembrei o momento e o porquê de a ter criado. Algumas tão pessoais que só eu as posso interpretar, embora quem leia também interprete segundo a sua própria vivência e se identifique. Também os sentimentos que me acompanhavam: Alegria; Amor; Dor; Decadência; Desejo; Erotismo; Esperança; Fantasia; Inquietação; Introspecção; Liberdade; Loucura; Magia; Melancolia; Paixão; Paz de espírito; Poder; Raiva; Religião; Serenidade; Solidão (boa e má); Sonhos; Ódio…
A todos etiquetei e partilhei neste cantinho, um mundo diferente, pelo menos para mim. Escrevi, publiquei e esqueci… Segui em frente em busca de novas aventuras. E ainda bem. Sinal que tenho a vida preenchida e não estou preso ao meu passado.
Mas não nego que fico feliz por poder usar esta máquina do tempo quando assim o desejar :)


sábado, julho 20, 2013

OS MEUS “EUS”

 

De quando em quando dou por mim a recriar-me. Porquê? Uma vida não me chega! Aliás. Mil vidas não me chegam! Quero experimentar todas as sensações, provar todos os sabores, voar todos os céus…
Se o universo é tão grande, porque me hei-de limitar a ser apenas eu, no meu mundinho pequenino? Não. Quero ir mais além. Quero ser muitos “eus” e muitos ainda são poucos para quem deseja o infinito!
Por isso recrio-me em novas versões de mim mesmo, com novas roupagens, novos personagens a rodear-me e novos enredos quase irreais. Salto, assim, de realidade em realidade porque só o “aqui” não me basta.
Já vim até muito longe com as asas que o sonho me dá. Mas o longe ainda é muito perto para quem quer ir aos extremos da imaginação. Talvez com isto me perca na liberdade da minha própria criação… 
Ou talvez eu seja assim mesmo, em constante mudança. Em viagem entre o cosmos da minha própria consciência, onde existe um universo imenso de estrelas de sensações. Onde existem incontáveis “eus” a renascer constantemente…


sábado, julho 13, 2013

AMANDO A LIBERDADE


Brisa fresca do mar. Sopra na minha direcção e refresca o inferno que cresce em mim. Acalma os meus medos, frustrações, ódios, desânimos e derrotas. Acorda os meus sentimentos mágicos e faz com que a vida, com toda a sua força me cubra de ânimo para que não tema enfrentar o mundo!
Brisa fresca do mar sopra com serenidade e deixa que abra as minhas asas para voar nos teus braços. Deixa-me subir bem alto onde os sonhos me chamam e percorrer o infinito amando a liberdade.


sábado, julho 06, 2013

O LUGAR


Não sou deste sítio. Sou de outro lugar, com outras gentes, outras ideias, outros olhares, outras aventuras e outras coisas.
Não sei onde fica, sei apenas que existe e é de lá que sou. Longe ou perto, desconheço o caminho. Guia-me apenas a certeza da sua existência.
Já tentei moldar esta terra à imagem da que eu pertenço. No entanto sou só um e sou exageradamente pequenino quando luto contra tudo e todos ao mesmo tempo.
Além disso, desse lugar que almejo, sei apenas que existe. Portanto, mesmo que fosse capaz, jamais conseguiria recriar o que não conheço.



sábado, junho 22, 2013

DESENHAR SUSSURROS


O homem chegou num passo descontraído inspirando o ar puro que o rodeava. Era uma clareira perdida no meio da floresta, longe de olhares indiscretos. No centro encontrava-se uma rocha que, embora natural, parecia polida propositadamente pelos elementos e o tempo, de forma a parecer um banco onde qualquer um se pode sentar. A julgar pelos trilhos que a rodeavam muitos eram os que o faziam.
O homem sentou-se e da mala que trazia consigo tirou uma viola. Ele devia ter à volta de cinquenta anos, tinha o cabelo comprido salpicado pela cor grisalha e a barba já não via uma lâmina há algumas semanas. A sua roupa estava desgastada, certamente pelo uso constante. A sua figura de mendigo contrastava com o sorriso que emanava do rosto e do brilho no seu olhar. Era visivelmente feliz.
Tirou também um pau de incenso que colocou a queimar entre as cordas da cabeça da viola. Então respirou fundo e com as suas unhas longas começou a dedilhar uma melodia fantástica. Parecia que vários instrumentos tocavam em simultâneo. A música tinha tanto de belo como de sobrenatural. Era um som mágico, hipnotizante, sedutor, que despertava sensações arrepiantes de fascínio.
As expressões faciais do homem davam a entender que estava a ter uma conversa com alguém através daquela melodia mágica. Ora se mostrava empolgado como se contasse uma aventura, ora amargurado como se lhe contassem algo triste, ora emocionado como se tivesse a fazer uma declaração de amor. Por vezes parecia desenhar sussurros nos seus lábios, que acompanhavam as notas encantadoras que raiavam das cordas da viola.
Que estranha conversa era aquela? Com quem falava ele naquela linguagem feiticeira? Seria com a natureza que o rodeava? Com a alma da floresta? Com os espíritos que assistiam àquela melodia encantada? Ou seria apenas a loucura de um génio a conversar com ele mesmo num momento de criatividade divina? Decidi que não quero saber a resposta. Há coisas que não se explicam e devem permanecer assim na memória. Envoltas num cenário de magia…



sábado, junho 01, 2013

SILHUETA


Gosto de percorrer o teu corpo com desejo. Deixar os meus dedos viajar através das tuas curvas sem destino certo. Permitir que a tua pele me guie enquanto se agita entre arrepios de prazer que anunciam a tua ânsia. 
Os teus gemidos de deleite são como poesia encantada declamada na linguagem dos anjos. O teu rosto emana beleza quando te entregas a estes momentos inebriantes. Toda a tua silhueta se torna deslumbrante e todo eu me transformo em fogo para te provar. Sentir o gosto da tua carne, da tua sensualidade, da tua feminilidade mágica na minha boca voraz enquanto as minhas mãos ferozes te agarram para mim e louco te possuo.
Perco-me no teu olhar de êxtase e contemplo a tua face divinal. Tudo se torna esquecimento, tudo se torna vida, tudo é entrega, num caos de sensações carnais onde o espírito mergulha fascinado. 
No apogeu do momento, quando tudo é luxúria, quando nós somos um e juntos somos magia, um universo é criado pelas forças que nos unem. 


sábado, maio 25, 2013

AMANHECER


Vento que sopras forte e vais empurrando as nuvens para longe, rumo ao seu destino incerto. Trazes contigo o frio que assombra o pensamento.
Interrogo-me que navios fantasma impulsionas tu nas suas velas desgastadas pelo tempo, nesse céu transformado em mares de lembrança?
Sopra para terras distantes, para outros povos e outras vidas. Leva contigo o passado e deixa que a manhã traga o futuro no seu amanhecer radiante.


sábado, maio 18, 2013

EXTREMOS DE MIM



Parte de mim é o desígnio de Deus; a outra parte resulta da minha própria vontade.
Parte de mim é uma massa disforme e grotesca; a outra parte é de uma beleza inebriante.
Parte de mim são palavras sem sentido; a outra parte é poesia escrita num momento de criatividade divina.
Parte de mim é ódio raivoso como um demónio indomável; a outra parte é amor tal como um anjo enviado dos céus.
Parte de mim é derrota humilhante; a outra parte é vitória triunfante.
Parte de mim é caos imprevisível a dançar ao som de todos os ritmos; a outra parte é ordem, perfeita e severa onde o erro não existe.
Parte de mim é o esquecimento trazido pelo tempo; a outra parte é o futuro a ser edificado. 
Parte de mim são segredos ocultos e profanos escondidos nas sombras; a outra parte é magia alva como a luz do dia.


sábado, maio 11, 2013

DESPERTAR


Quero acordar!
Despertar deste sono profundo em que mergulhei. Afastar este mar de marasmo que me envolve. Libertar-me do mundano que me prende.
A derrota aparece de onde menos se espera. Ataca de forma imprevisível e goza-nos em tom de sarcasmo. Suponho que seja o preço a pagar por se prestar culto à inteligência.
Assim estou: derrotado e envolto em sonolência a observar os dias que passam sem história.
Sobra-me tempo para inventar desejos.
Mas desejar não basta! Quero a glória das grandes vitórias. Que o meu nome seja sinonimo de triunfo!
Não me vou deixar adormecer quando a vontade que existe em mim é acordar!


sábado, abril 20, 2013

DISTANTE


Hoje, tudo me parece demasiado mundano. Sinto-me afastado do que me rodeia. Assuntos, pessoas, lugares, cenários, até de mim próprio. A minha mente vagueia longe de tudo por sítios que não compreendo. Viaja como se tivesse vontade própria que não a minha.
Sinto-me distante de tudo…
Procuro-me pelos becos da existência em devaneios que se confundem com loucura. Deixo-me estar só. Numa esperança sem nexo de que a solidão tenha consciência. Talvez tenha, porque só ela me compreende nas nossas conversas caladas…
Mas eu sou humano, fadado pelos sentimentos.
Eu odeio. Sinto a fúria a tomar conta de mim quando se elevam injustiças.
Eu também amo! Sem medo. Entrego-me ao amor com todas as minhas forças porque é o único caminho para a felicidade. Disso não tenho dúvidas.
Então porque estou tão longe?
Porque desejo o infinito…
Então hoje deixo a minha mente ir para longe. Talvez traga de lá mais sabedoria. Amanhã estarei de volta, com a minha sina de humano, para me misturar com todos os outros e tentar ser diferente.


sábado, abril 13, 2013

CRENÇA IMORTAL


O vampiro escreveu um poema numa língua antiga, já esquecida no tempo. Foi assolado por recordações de quando, no seu peito, um coração batia quente e nele corria sangue humano. Tempos esquecidos na memória das gentes em que ele era um poeta. Nos seus versos escrevia contos de amor, beleza e dor, quando o sol podia iluminar os seus dias.
Mas essas lembranças são longínquas e até difíceis de compreender. Muito tempo passou e atrás dos tempos vieram tempos. Tantos que já não conseguia contar. Civilizações nasceram, civilizações morreram. Impérios foram criados, impérios foram destruídos. Deuses desceram à Terra, Deuses ascenderam aos céus. Eras caíram sobre outras eras apagando a suas memórias e vestígios. Lendas ficaram algum tempo, adulteradas e depois esquecidas como todo o passado.
Só a poesia se mantém imutável. Serva da beleza, do amor e da dor. Mundos vieram, mundos esqueceram-se. Só a poesia continuou igual. Por isso o vampiro continuou a escrever versos com o sangue da sua memória, a dor da sua emoção, a beleza que tanto venera e uma crença imortal no amor…



sábado, abril 06, 2013

GROTESCO



Sou um híbrido. Estou entre o perfeito e o horrendo.
Chamam-me lutador, mas não me lembro de receber aplausos quando entro no ringue.
Chamam-me herói, mas não reconheço em mim qualquer feito digno de relevância.
Chamam-me monstro, quando estou de costas. Desviam o olhar com repugnância.
Pois eu não gosto de ficar no centro. Quero pertencer a um dos extremos, por isso, escolho o grotesco.
Não me condenem, mas eu tenho de ser honesto convosco:  Não existe um mundo perfeito. Existe apenas ilusão, aquela que vocês alimentam!
E eu não vos posso julgar, pois também salto para esse lado quando a verdade me cansa…


sábado, março 23, 2013

BEIJAR A POESIA



Hoje escrevo-te um poema de amor. Ou melhor, uma prosa que beija a poesia! Pois são apenas palavras que desaguam em frases que juntas moldam uma carta.
Falo-te de amor! Não como amam os homens, nem os deuses, nem as almas que buscam a sua gémea.
Descrevo-te um amor profundo, semelhante a um núcleo escaldante que ao explodir criou o universo. 
Um amor etéreo, como as forças que unem as estrelas do cosmos numa distância infinita.
Um amor grandioso, quente, acolhedor, que se confunde com a própria sabedoria divina e cria pontes entre os nossos corações, como portais entre as nossas essências.
Chego à conclusão que as palavras não traduzem este amor que quero transmitir. Fica o brilho no meu olhar ao contemplar-te que ao resplandecer com tanta vida diz tudo no seu silêncio...


sábado, março 16, 2013

AMANTE



As vossas prisões feitas de preconceitos e morais perdidas no tempo de nada valem. Não são cárceres para mim.
Sou um pirata sentimental em busca de emoções para que a minha vida seja rica em aventuras.
Vagueio de coração em coração saqueando vivências. Para mim esses são os tesouros mais belos.
Sou um salteador de sentimentos devotado à liberdade. Fiel apenas aos meus próprios princípios que nada têm a ver com restrições.
Sou amante da boémia, da paixão e da loucura. Viajante por sonhos cheios de infinito. Descobridor de segredos que se escondem na simplicidade, encantado pelo canto da sabedoria.
Salto entre a religião e a ciência para me fascinar com a beleza que a vida me oferece.
Talvez me chamem poeta porque as minhas palavras são livres e telepaticas, mas elas transmitem apenas os tesouros que vou acumulando.
Este é o meu caminho, de um sonhador dedicado. Complexo talvez, mas livre para criar…


sábado, março 09, 2013

IMPULSO



O vento sopra forte, uivante e assustador. Como espectros que gemem na sua agonia eterna. Traz consigo nuvens sombrias que ameaçam tempestades.
Talvez seja a voz do meu próprio medo que me sussurra palavras tenebrosas aos ouvidos. Não. Os meus medos infantis já há muito que me abandonaram.
Talvez seja a raiva a lembrar-me de quem eu sou. Trajando-me com vestes negras e ameaçadoras. Não. A minha ferocidade não precisa de ser recordada.
Talvez seja a minha ânsia de voar entre os céus amargurados da sabedoria a querer abrir as minhas asas de anjo. Ou demónio? Não. Luz ou trevas não me definem. As duas partes existem em mim como uma só. Qualquer julgamento em contrário é somente uma opinião que para mim pouco vale.
Sopra vento, sopra uivante! Abre as minhas asas, às vezes negras, às vezes brancas. Impulsiona-me com o bem e o mal. Mas deixa-me marcar a diferença com o meu voo transcendente…


sábado, março 02, 2013

POTÊNCIA COLOSSAL



       – Estás pronto para percorrer o infinito? – Perguntou-me com ar descontraído ao sentar-se na cadeira do piloto.
       Anui. Podia ter falado mas estava num estado de emoção apática. As palavras não me saíram. O silêncio definia-me melhor. A minha mente estava invadida por pensamentos absortos. Não sabia explicar se era um imenso vazio ou milhares de expectativas para aquela viagem rumo aos confins do desconhecido.
       Observava-o enquanto mexia com perícia nos botões de navegação. Conhecia bem aqueles movimentos. Um enorme ecrã surgiu à nossa frente mostrando o local de descolagem. Colocou a música «Contentores» dos «Xutos e Pontapés» para nos fazer companhia. Boa escolha. Acho que se adequava com perfeição ao momento.
       A nave estava pronta. Com um simples comando arrancou, poderosa, em direcção ao cosmos. No ecrã vi o planeta a ficar para trás a uma velocidade vertiginosa. Na realidade, a sensação que tinha é que era a própria Terra que se afastava de nós. 
       Tudo era diferente do que tinha imaginado. Parecia que estávamos parados e o espaço é que se deslocava em nosso redor. Os motores eram silenciosos, inaudíveis mesmo. Não faziam adivinhar a potência colossal daquela máquina que traçava caminho entre as estrelas.
       A música mal tinha chegado a meio e o nosso planeta já tinha desaparecido do ecrã, como se tivesse fugido de nós levando consigo os nossos pecados. Que velocidade levaríamos? Grande… Muito grande certamente. Agora apenas se viam as estrelas que passavam a correr trazendo atrás de si o nosso destino. Um recomeçar de novo…