Sentimentos, aventuras, pensamentos, histórias, poemas, ideias e escrita caseira...
terça-feira, setembro 29, 2020
Simetria entre opostos
terça-feira, setembro 22, 2020
A ilha de "Lost"
Setembro é um mês agridoce. Tem no seu ventre o conforto caloroso do verão e em simultâneo abre as portas do outono e traz consigo os primeiros dias invernosos. No entanto esta história aconteceu no fim de um dia quente. Quando a noite começa a cair e as primeiras estrelas convidam a olhar o céu.
– "Gosti" – disse com uma certa meiguice que só ela sabia ter.
– Como quem gosta de quê? – Questionou ele, não porque duvida-se, mas porque gostava de viajar nas palavras dela.
– Como quem gosta da lua cheia. – Respondeu sorrindo, sem timidez.
– Desenvolve. – Insistiu ele com alguma frieza, tal como seria interpretada por quem não o conhecesse.
– Daquelas gigantes que hipnotizam! – Concluiu ela.
– Já eu, gosto de ti como uma ilha deserta. Daquelas com praias fantásticas e florestas supertranquilas. Mas depois, quando começamos a explorar, vamos encontrando vários mistérios cativantes. Tipo aquela ilha de "Lost". – Disse ele narrando as palavras de forma a dar corpo ao sentimento.
– Ganhaste no desenvolvimento. – Comentou ela refugiando-se no sorriso.
– Também podias ter desenvolvido mais. Se quiseres continuar eu não me queixo… – Lançou-lhe o desafio, apesar de saber que seria difícil obter a continuação, já que as suas confidências são raras.
– Agora não. Tenho de ir […]. – Deixou de a escutar no momento em que disse que tinha de fazer uma mundanice qualquer. As banalidades do mundo sempre foram demasiado aborrecidas para ele. Principalmente na companhia dela.
Contentou-se com a resposta expectável. Já sabia que ela era assim, fugidia. Chega, deixa o mistério no ar e depois vai embora com um pretexto qualquer. Não se importou em demasia. Tinha conseguido que ela lhe oferecesse um pouco do seu tempo gratuitamente. Isso para ele era muito.
A conversa talvez continuasse depois, num dia qualquer, noutro momento em que a poesia estivesse presente na decoração da natureza. Ou então, quando os sentimentos tentassem enganar a inquietude e tomassem as palavras por escape.
Contemplou o anoitecer. Não é preciso ser poeta, ou artista, para interpretar a beleza das estrelas no céu a brilhar numa noite amena. Basta gostar da tranquilidade que vai surgindo como recompensa depois da confusão dos afazeres humanos.
De certa forma aquela conversa continuava, silenciosa e distante. Como tantas outras que aconteceram antes. Pintada no cenário sossegado da noite que cai e das estrelas que cintilam ao fazer viajar a imaginação...
segunda-feira, setembro 14, 2020
Qual é o teu sonho?
Nunca compreendi porque chamam "sonhos" aos nossos projectos, ideias, ou ambições. Sonhar é algo que pertence ao sono. Uma realidade abstracta que ocorre enquanto dormimos, sem relevância maior, destinada apenas ao esquecimento.
Dizem os entendidos que é o cérebro, com os seus mistérios, a reordenar os pensamentos. Nada de especial, portanto. Pelo contrário até, apenas um computador a desfragmentar toda a sua informação. Visto por este prisma nada existe de extraordinário em sonhar. Ainda que, tenho de admitir, seja algo que levante curiosidade pela sua excentricidade.
Mas voltando ao pensamento inicial, aplicar o termo "sonhar" para aquilo que desejamos, indica, só por si mesmo, algo não realizável.
Não! Eu não "sonho" dessa forma!
Prefiro expressões como fantasioso, imaginativo, inconformado, visionário, idealista!
Não! Não me perguntem qual é o meu "sonho"!
Eu sou daqui. Não estou a dormir. Estou acordado. Talvez até demais.
Estar acordado por vezes dói mas só assim consigo ver com precisão as linhas com que é tecido o mundo. A realidade crua em que a nossa forma se perde entre os chamados "sonhos por realizar".
Posso imaginar uma utopia, impossível do ponto de vista humano, contudo se a descrever numas quantas linhas esta passa a ter o estatuto de ideia. Depois, quem sabe, pode inspirar outros, com saber suficiente para a tornar realidade.
Seja como for, a fantasia que criei acordado, ganhou forma. Algo palpável para quem compreende a linguagem dos que pensam para lá da linha do horizonte.
A maior parte das pessoas, desses que têm "sonhos", são os mesmos que excluem gente como nós. Os que vivemos rodeados por arte e poesia. Nós, os que conhecem a realidade e sabem que ela não basta.
Tu, que estás aí desse lado, a ler estas palavras e identificas-te nelas como se fossem as tuas próprias, fica a saber que a tua condição não é única, muito menos isolada. És somente fruto do desprezo de quem não consegue ver mais do que os limites pelos quais são rodeados.
Não aceites os julgamentos nem conselhos dessa gente comum. Dizem que "sonham" e por isso acham-se diferentes. Não passam de cópias uns dos outros. Do nosso mundo não sabem nada e nós também não os queremos cá!
Deste lado da fantasia só as nossas verdades nos podem orientar!
segunda-feira, setembro 07, 2020
Interlúdio entre o dormir
quinta-feira, setembro 03, 2020
Fulana, sicrana e beltrana
Acordei com o som de umas senhoras animadas que conversavam na rua. A julgar pelo timbre da voz, diria que a idade já lhes pesava um pouco, mas não o suficiente para lhes roubar o vigor das palavras.
No meu quarto não consegui perceber o teor da amena cavaqueira. Aqui e ali conseguia compreender qualquer coisa, embora não fosse preciso grande especialista para chegar à conclusão de que se tratavam de coscuvilhices.
Não estava totalmente desperto mas certos fragmentos ditos chegavam a mim: "Fulana isto, sicrana aquilo, beltrana acoloutro". Alguns vocábulos que o meu ouvido captava e denunciavam o tema daquele falatório matinal.
No meio das frases por vezes surgia uma gargalhada que se contagiava a todas as outras intervenientes, já, logo de seguida, o tom das vozes baixava quase para murmúrios completamente imperceptíveis. O assunto, por vezes, mudava de sentido rapidamente.
Achei toda aquela cena divertida e caricata. O estereótipo de velhas alcoviteiras ali mesmo ao pé de mim, vivo, na pele enrugada daquelas mulheres sem pressa. Entretidas com a sua tagarelice que me serviu de despertador.
Não me levantei para observar pela janela os seus rostos. Em vez disso deixei-me ficar na cama com a figura delas a ser desenhada pela minha imaginação. Acredito que a recordação tem mais piada assim. Não quis que a realidade me estragasse a imagem.
O sono tinha cumprido a sua função de retemperar as minhas forças físicas e anímicas. Não havia melancolia, nem irritação, só uma preguiça banal, típica no ser humano comum. Fiquei grato por ser dessa maneira. Acordar de forma banal sem o peso do sentir.
A manhã começou assim entre vocábulos alheios. Com uma pequena história, sem nada de verdadeiramente interessante, para contar. De qualquer maneira decidi aceitá-la como uma dádiva e como recompensa decidi transcrevê-la sobre a forma de conto, mesmo que desinteressante.
É tão simples quanto isto. Sem me preocupar com ideias magnificentes, deixo por escrito, em palavras embelezadas, para que conste no futuro a quem por aqui passe a ler, de que, neste dia em particular, acordei contente!