quarta-feira, abril 15, 2020

Entre a desconstrução de todas as certezas


Depois, quero amar. Como se esse sentimento fosse novo e reinasse a ingenuidade no meu ser. Usufruir desse privilégio sem temor. Assimilar cada verso do momento e torna-lo inesquecível. Escrevo todo este meu desejo porque a esperança se quer tornar visível, palpável e insistente entre a desconstrução de todas as certezas.
Agora, tudo isso é supérfluo. Os rostos, os corpos, as histórias estão lá, mas de pouco servem quando o medo está presente em cada pensamento. O receio sobrepõem-se acima de qualquer atracção e impede que esta aconteça. A ideia é breve. Também ela se esconde perante a incerteza.
Depois, quero descobrir coisas novas. Sempre algo que enriqueça o meu saber e alimente o sonho. Soltar a criança que habita no refúgio da minha aparência adulta, atrás das palavras maduras e comportamentos ponderados. Brincar como quem não suspeita das agruras que há no mundo.
Agora, é mandatório suprimir as emoções. Impera a lógica dos comportamentos estudados nos livros, escritos por quem se deu ao trabalho de os tentar compreender. A sensibilidade resume-se às regras que é suposto seguir. Ainda assim, as lágrimas pesam e rasgam na pele de quem as verte logo após de calar os gritos.
Os olhares falam na distância porque o toque é duvidoso. Apoiamo-nos nas recordações como muletas para não esquecermos quem somos, ou quem fomos, porque o passado vai longe e hoje somos outros. Alguém que ainda não compreendemos. Gente que se vai tentando orientar mesmo à deriva. Tudo o resto é dúvida.
Frente a frente as palavras faladas são poupadas, como se a voz cuspisse fogo. As conversas de circunstância anulam-se para abrir espaço ao silêncio, como se este fosse sinónimo de segurança. O que é dito entre paredes é breve. O eco nos corredores cavernosos relembra a tirania da angústia.
Já cá fora, quando as silhuetas se acautelam na distância, verbalizam-se as vontades, as opiniões, as ideias, ou mesmo até confissões, mas principalmente anseios desse amanhã que há-de chegar.
Nascem promessas de coisas que nunca fizemos, ou até de gestos banais, daqueles que antes eram esquecidos entre todos os afazeres diários e que neste momento se transformaram em saudade. Tudo mudou, tão rápido, entre avisos preocupados que os “maiores” não escutaram.
Agora, cá em baixo estamos nós. A tentar conter o caos, até que se torne normal. Sim, porque o que se repete vai-se entranhando no hábito. Seja o que for. A rotina constrói-se assim, mesmo entre a desordem, por mais estranho que pareça ser. Resta a lembrança, como âncora a um mundo que parece longínquo. Uma vontade invencível que não deixa o cansaço vencer. Seguimos, fortes, de cabeça erguida e passos firmes! Com esperança!
Depois, vai ficar tudo bem!