quinta-feira, setembro 03, 2020

Fulana, sicrana e beltrana

Acordei com o som de umas senhoras animadas que conversavam na rua. A julgar pelo timbre da voz, diria que a idade já lhes pesava um pouco, mas não o suficiente para lhes roubar o vigor das palavras. 

No meu quarto não consegui perceber o teor da amena cavaqueira. Aqui e ali conseguia compreender qualquer coisa, embora não fosse preciso grande especialista para chegar à conclusão de que se tratavam de coscuvilhices. 

Não estava totalmente desperto mas certos fragmentos ditos chegavam a mim: "Fulana isto, sicrana aquilo, beltrana acoloutro". Alguns vocábulos que o meu ouvido captava e denunciavam o tema daquele falatório matinal. 

No meio das frases por vezes surgia uma gargalhada que se contagiava a todas as outras intervenientes, já, logo de seguida, o tom das vozes baixava quase para murmúrios completamente imperceptíveis. O assunto, por vezes, mudava de sentido rapidamente. 

Achei toda aquela cena divertida e caricata. O estereótipo de velhas alcoviteiras ali mesmo ao pé de mim, vivo, na pele enrugada daquelas mulheres sem pressa.  Entretidas com a sua tagarelice que me serviu de despertador.

Não me levantei para observar pela janela os seus rostos. Em vez disso deixei-me ficar na cama com a figura delas a ser desenhada pela minha imaginação. Acredito que a recordação tem mais piada assim. Não quis que a realidade me estragasse a imagem.

O sono tinha cumprido a sua função de retemperar as minhas forças físicas e anímicas. Não havia melancolia, nem irritação, só uma preguiça banal, típica no ser humano comum. Fiquei grato por ser dessa maneira. Acordar de forma banal sem o peso do sentir.

A manhã começou assim entre vocábulos alheios. Com uma pequena história, sem nada de verdadeiramente interessante, para contar. De qualquer maneira decidi aceitá-la como uma dádiva e como recompensa decidi transcrevê-la sobre a forma de conto, mesmo que desinteressante.

É tão simples quanto isto. Sem me preocupar com ideias magnificentes, deixo por escrito, em palavras embelezadas, para que conste no futuro a quem por aqui passe a ler, de que, neste dia em particular, acordei contente!


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