Despertei a uma hora inexistente da madrugada. Os outros lá de casa dormiam no mais profundo silêncio do seu descanso. Como se fossem somente parte do cenário. Apenas sombras por distinguir na penumbra. Vultos cuja história caiu em esquecimento.
Na escuridão pareciam evidenciar-se cores que não conhecia. Tonalidades berrantes que desafiavam a realidade. Sei que não estava a sonhar nem tão pouco semi-desperto. Quem sabe, estava num estado de consciência ainda desconhecido da sabedoria humana. Um momento longe do real que, talvez mais tarde, fosse remetido ao esquecimento do verdadeiro acordar.
Sabia apenas que a noite já ia longa e a manhã não devia tardar muito. Não procurei o relógio, creio que tentar orientar-me no tempo ia destruir a incógnita do momento. É um acto de heresia estragar o mistério de ocasiões assim, onde o pensamento se eleva acima da carne humana e da ciência que a rege.
Por vezes, acontecem revelações em instantes como este. Sem percepção temporal da sua dimensão. Embora, desta vez não tenha nada em especial a desafiar a minha inquietação. Ou, quem sabe, estava demasiado desatento para conseguir entender qualquer epifania nocturna.
Para além do desassossego não entendi outro propósito. Eu, com os meus devaneios, numa tentativa poética de transcender a banalidade. Creio que foi só isso. Nada com uma grandiosidade que mereça relevo nos porquês da existência.
Baixei as pálpebras e busquei conforto na roupa da cama para regressar novamente ao sono. Sei apenas que este chegou novamente para camuflar os meus pensamentos neste simples interlúdio entre o dormir.
Contudo, de forma contrária ao esperado, o dia, na sua lucidez, recordou-me este momento. Algo que provavelmente não passou de meros segundos perdidos entre sonhos. Sem qualquer importância, mas que teima em desafiar a minha compreensão.
Seja como for, não ousei descartar o seu mistério. Gosto destes pequenos nadas que tanta coisa dizem. Há sempre algo que se esconde por detrás daquilo que não tem significado. Não consigo interpretar o seu intento e possivelmente seja esse o seu fascínio.
Coisas pequenas que se vão acumulando na enormidade do pensar. Nada de especial com tanto para reflectir. Se não fosse assim a condição humana era crua, sem temperos e insuportável. Para concluir o devaneio, envolvo-me em pensamentos sobre coisa nenhuma e isso é lindo!
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