Vi uma mosca varejeira generosamente gorda pousada em cima de uma flor no jardim. Parecia que a sua "boca" saboreava alguma parte viscosa que compunha a cor amarela da dita flor.
Tomado pela preguiça e pela minha posição sentada, desejei ser como um daqueles lagartos, que conseguem atirar a língua para longe para poderem capturar a sua presa.
O universo, com toda a sua imaginação criativa, não quis que os seres humanos tivessem esse dote natural. No entanto ali estava eu descontraidamente no jardim com vontade de comer uma mosca apetitosamente gorda.
Afinal de contas qual será o sabor de uma mosca? E porque haveria eu de a querer comer se não faz parte da minha dieta?
Acredito que fazia mais sentido se quisesse comer a flor. Mas não sei porquê pareceu-me que tinha um sabor azedo. Nunca me lembro de ter comido uma flor, talvez o tenha feito na minha meninice e o meu cérebro retenha essa memória no meu subconsciente.
Existiam outras varejeiras pousadas em outras flores espalhadas pelo jardim. Mas essas não me cativaram. Só aquela. Talvez fosse o seu brilho esverdeado que me chamasse a atenção, embora, provavelmente fosse apenas por estar diretamente de frente para o meu campo visual.
Não tendo uma língua extensível de lagarto, portanto, deixei a mosca continuar pousada sobre a flor a fazer o que as moscas fazem pousadas nas flores.
No entanto a curiosidade continuou focada no inseto e lamentei que não falasse português, ou qualquer outra língua de gente. Acredito que uma conversa entre um humano preguiçoso e uma mosca gorda pousada sobre uma flor trouxesse algumas revelações sobre os mistérios da existência.
Contudo, talvez não existam mistérios nenhuns. Cada bicho tem o seu prazer, exclusivo da espécie a que pertence. Eu com a minha preguiça, a mosca com a sua flor, o mundo a fazer sentido para alguém que o compreenda.
O pensamento é estranho e isso é lindo. Vai por caminhos impossíveis onde o corpo não chega com a sua limitação tridimensional. Basta saber que é assim. Mas será que é mesmo assim?
2 comentários:
Texto simplesmente extraordinário que me fascinou ler. Um sentido irónico fascinante e exemplar. Se calhar já muitos de nós, ao ver uma mosca pousada, ou outro inseto qualquer, imaginámos ser lagarto/camaleão, de lingua comprida e pimba, tragá-la.
Mas uma verdade também sabemos: É que com mosca ou sem mostra, existe muita gente de "lingua comprida", lol
.
Cumprimentos poéticos
.
Pensamentos e Devaneios Poéticos
.
Muito bom este texto, bem escrito, meus parabéns.
Arthur Claro (Instagram: @radiobagaralho)
http://www.arthur-claro.blogspot.com
Enviar um comentário