domingo, dezembro 22, 2019

Fragmentos da verdade


Mas afinal o que é que os outros sabem do meu mundo e eu do deles?
Julgamo-nos pela moda que seguimos, pelas palavras que repetimos, pelos gestos que fazemos. Será que isto é o suficiente para conhecer alguém? Se estes critérios servem para alguma coisa é para confundir quem avalia. Nada mais!
Eu, como ser dito inteligente, não me mostro pela aparência. Por vezes até repudio aquilo que vejo no espelho. Não me reconheço ali naquela imagem vulgar. Portanto os outros também não o conseguem fazer, ainda que acreditem conseguir.
Talvez haja demasiada complexidade dentro de mim, já que, até hoje, ainda não me encontrei. Não sou uma fórmula que possa ser calculada matematicamente. Aliás tudo o que de grandioso há em mim não é visível, nem palpável, muito menos medível por qualquer ciência.
Tenho um certo orgulho neste meu ânimo incompreensível. Aquilo que sou está cá dentro atrás do olhar. Escondido do observador comum. Até de mim próprio, já que desde que me entendo como gente a única coisa concreta que me pode definir é uma constante mudança!
Quantos de nós podemos dizer que somos os mesmos que éramos há um ano; um mês; ou mesmo ontem? Suponho que ninguém. Mesmo o homem mais básico não é imutável. Cada dia traz algo novo, mesmo que imperceptível à consciência humana. E vamos modificando, cada um com o seu ritmo.
Por isto, aquilo que conhecem de mim é completamente diferente. Varia consoante a visão de quem me indaga. Eu não sou o mesmo para ti, para os meus pais, irmãos, filhos, amigos, colegas, ou para quem se cruza comigo na rua por breves instantes de reparo.
Na realidade, existe, para cada pessoa, uma versão completamente diferente de mim. Única e exclusiva. Criada na mente de cada um à imagem do seu saber. Nenhuma delas verdadeira. Apenas fragmentos da verdade.
Existem, assim, muitos outros “eus” lá fora no mundo. Nenhum deles real!
Sou, portanto, um mistério. Para mim e para os outros.
Assim somos todos.  Insondáveis. No fundo nenhum de nós conhece os demais. Somos inalcançáveis ao saber alheio, pelas nossas próprias limitações, preconceitos e constante metamorfose.

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