quarta-feira, janeiro 11, 2017

Nome de gente


Galinhas. Passarada que muito pouco tem de interesse. Aves sem glória a quem Deus decidiu não abençoar com a proeza de voar. No entanto, alheias a estes reparos, esgravatam a terra incansavelmente em busca de uma qualquer pedrita que sirva de alimento. “Grão a grão enche a galinha o papo”. Agora percebo porquê.
Fazem-no com mestria por entre as folhas caídas de outono e o chão sujo que vão rapando. Ora um remexer. Ora uma bicada. Para eles é indiferente se encontrarem uma pequena pedra ou um grão de ouro. Tudo é igual. Debicam os dois da mesma forma, sem o fardo de reconhecer a riqueza.
Para lá do galinheiro nada sabem da vida dos homens, além do seu tratador que, a horas mais ou menos certas, vai trazendo a ração. Ingerem-na com gosto e rapidez sem saberem que o objectivo daquele petisco é engordar. Se alguém tentar explicar o porquê da engorda será que compreendem?
Eu não consigo. Se me tentar abeirar desatam a esvoaçar e a fazer um enorme chinfrim. Vêem-me como uma ameaça. O único humano que deixam aproximar é aquele que lhes serve aquela gulodice. “Instruí-los é uma ideia parva”, concluo.
Depois daquele repasto, a que todos acorrem para se saciar, retomam novamente à sua natureza de explorar a terra em busca de alimento. Suponho que a ração é apenas um luxo e para eles, afinal, aquela é a definição de fortuna. A terra não se esgravata sozinha. A pausa sabe bem mas não tarda a ouvir-se as patas e os bicos na sua senda.
Algumas escavam mais fundo. Uma cova perfeita, de linhas arredondadas e medidas irrepreensíveis, onde acomodam o seu corpo para descansar. Aconchegam-se. Vão dormitando. São como férias, ou um fim-de-semana perlongado, depois da labuta diária. Isto em tempo de galináceos. Já que o tempo deles é diferente do nosso.
Será que aqueles bichos têm nome? Podia apelidá-los com nome de gente, já que gente me fazem lembrar na sua rotina. Uma ideia parva. Ou talvez não… O devaneio já vai longo e há mais coisas para entreter a minha atenção. Deixo aquela “gente” no seu mundo imenso, (que para mim não passa de um galinheiro), entregues ao seu deus que os reconforta com ração.

2 comentários:

Anónimo disse...

até me apetece dizer...há cá cada galinha!!!

abraço

ps: a tua última frase está de estalo..."deixo-as entregues ao seu deus que as reconforta com ração!!!"
brutal, nem eu no meu estado mais alunado me lembrava disto...veio-me logo à ideia algumas galináceas no seu capoeiro que enfim...

António Silva disse...

Algumas pessoas são galinhas, não há nada a fazer a não ser aceitar esse facto e deixar de pensar nisso.
Ideias que me ocorrem a olhar para um galinheiro...