Quando tentas adormecer sentes algo lá fora, a observar-te por trás das portadas fechadas. O mundo está recolhido, como se não existisse. Sobras tu e o que entendes por real. O medo que quase se pode tocar com as mãos quietas do horror. A irracionalidade é mais forte que tu.
Naquelas noites de insónia, em que o sono teima em não chegar, essa presença sombria é ainda mais forte. Chega-se ao pé de ti, escondida no breu da noite. Não sabes explicar o que é. Apenas que está lá parada a olhar para dentro de ti a penetrar na solidão. Como se estivesse prestes a interromper pelo teu ânimo com as suas mãos gélidas e invisíveis.
Por vezes, quando já dormes, parece que se senta na tua cama com o peso da sua inexistência. Acordas entre gritos desesperados que a garganta parece soltar instintivamente, buscando por um auxílio que não chega. Não tens a certeza que tenha tenha sido um sonho ou os sentidos a pregarem-te partidas de mau gosto, embora o teu nome seja sussurrado pelo silêncio.
É uma coisa obscura, sempre lá, mesmo de dia quando o sol raia alegremente. A luz, ajuda a esquecer a sua existência, embora, em certas sombras que surgem de repente tu vês a sua figura incorpórea. O seu negrume sem nome, consegue deturpar todas as cores vivas e iluminadas que compõem os teus segredos.
Vai, na sua voz calada, convidando aos pensamentos mais perversos que a maldade humana pode consumar. Não sabes o seu nome e assusta sabe-lo. Tens medo de o pronunciar, pois, pode tomar isso como um chamamento e vir a ti mais rapidamente. Com ele, trazer também a sua presença gélida para dentro da tua pele.
Em vez disso tentas chamar a alegria, numa tentativa de o mandar embora para outro lugar. Procuras salvação numa fé que não tens. A mesma a que recorres nas noites de invernia entre orações inúteis, que, por fazerem passar o tempo, te dão a ilusão de companhia e adensam o cansaço.
A noite vai longa e há silêncio. O mundo dorme e tu não. Lá fora, sabes que algo te observa, sem forma, ou explicação. És frágil e tens medo. Muito medo. Os teus olhos cerrados não expulsam o seu interesse e muito menos trazem o sono para te salvar. Aquela coisa não se pode ver, nem iluminar ou descrever. Simplesmente é.
Todas as justificações para a sua existência são tão válidas como inúteis. Mas no fundo, tu sabes que lá fora não há nada. O terror que sentes não vem de qualquer acção exterior. Muito menos de um mito folclórico que o possa descrever. Tu conheces bem a verdade, contudo, como quem se habitua a mentir a si mesmo com todas as suas forças, não consegues admitir que a maleficência está dentro de ti.
1 comentário:
Não temos todo uma sombra dentro de nós? Sabemos que está lá, bem dentro e no entanto temos medo de a enfrentar.
OS medos devem ser encarados de frente.
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