terça-feira, setembro 24, 2019

Lūna lūcet


Olhei para a Lua cheia e esqueci-me de todos os meus amores.
Erguia-se luminosa e soberana acima da escuridão profunda da noite. As estrelas recolhiam-se como que em submissão à Rainha do firmamento. Havia nela um feitiço, quase erógeno, que me impelia a contemplar o seu brilho hipnótico. Uma presença feminina, superior a toda a beleza, que nenhuma mulher podia ousar rivalizar.
Não existia toque, mas senti a sua carícia como quem partilhava o desejo com uma amante impossível. Entreguei-me ao erotismo poético de quem revela um segredo na hora do prazer. Houve um arrepio de silêncio sussurrado ao ouvido das trevas que me completam. Apresentei-me assim, com a alma despida de qualquer sol. Ofertei a minha ignorância virgem ao enigma da génese e sonhei.
Quando compreendi a ausência de sentido dos mistérios indizíveis do Universo, amei a liberdade como nunca tinha feito antes. Afinal, ser livre é ser parte de um todo, cósmico e infinito. O entendimento limita-se a si próprio na forma humana e aceitei isso como um dom. Algo na minha pequenez é imenso, tal como na origem de tudo que foi concebido pela sabedoria da criação.
Depois, o êxtase dissipou, entre o cansaço, o deleite e o sono. Tal como esvanecem todos os devaneios nas profundezas do esquecimento. A noite manteve-se iluminada, mas a magia calou-se. A Lua continuou cheia na sua imponência e foi amar outros que a admiravam, porque o amor é livre na sua incompreensão e todos devem provar o seu sabor, antes que chegue a madrugada…

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