O vampiro não compreende o Natal. Tantas luzes coloridas a violar a escuridão da noite. Gente feliz a passear pelas ruas da cidade sem se importarem com o frio.
Fazem-se embrulhos para as prendas compradas porque assim manda a tradição. Os padres rezam missa em igrejas cada vez mais vazias. Há sempre uma religião que substitui a outra. Há sempre hereges que dizem adorar o Deus menino, para de seguida se vergarem à publicidade do Pai Natal. Hoje quem manda é o paganismo, o consumismo, ou também a política, ou então a alegria de ter companhia.
Os sem-abrigo ficam invisíveis. Lá vai havendo um olhar mais atento pronto a dispensar uma esmola. Os mendigos apenas querem qualquer coisa quente, algo para o corpo, enganar o estômago e manter a ilusão viva de um amanhã melhor.
Os solitários, também ninguém os escuta. Ficam escondidos Como se as festas lhes fossem proibidas.
Lá longe, está a guerra. Pobres coitados nos títulos das notícias. Apenas isso. Não há vampiros na guerra. Só pessoas de carne e osso que mal reparam na data. Cada dia que passa é uma vitória, sem Pai Natal com presentes, ou padres com homilias.
O vampiro saiu para caçar e não demorou até encontrar uma presa. Mordeu, como mandam os seus instintos, a veia mais proeminente. Bebeu, mas estava vazio. Precisava de mais. Sentir os sonhos da sua vítima. Contudo no Natal os sonhos são escassos.
Continuou a procurar. Não tardou até capturar outro humano, bebeu mais uma vez e sabia a nada. Olhou para a cidade. Tinha a consciência de que ali não ia encontrar alimento. Em cada ano que passava a multidão tinha menos vida.
As cores enganam a noite, ludibriam também os sentimentos. O riso do Pai Natal fascina as crianças. Os enfeites mascaram todo o cinzento na paisagem da existência. Sonhadores deixam de o ser. Trocam a sua fantasia por aquela que é vendida.
Esta festa toda é muito confusa para quem só quer simplicidade. Perdido no meio de tantos pedidos, o vampiro lamentou desejar apenas um pouco de amor.
1 comentário:
Gostei de ler. Feliz dia (domingo) de Natal
Cumprimentos poéticos
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