Eu sou um observador de mim mesmo. Vejo-me com curiosidade quase científica. Neste processo divido-me em dois. Posso classificar um, como sendo sábio, caridoso e compreensivo; o outro, um bicho humano, com todos os instintos e sentidos a que essa condição obriga. Igual a vocês, na nobreza ou decadência.
Olho por mim como um pai bondoso cuida do filho. Por vezes orgulho-me daquela pessoa de carne e osso que sou. Sinto uma satisfação momentânea pelas pequenas conquistas que, chegam quase a ser um roçar na felicidade. Outras vezes repreendo-me severamente. Não tolero a ignorância propositada que por vezes abraço sem motivo algum.
Presto atenção os meus pensamentos. Não deixo que tomem um rumo que me leve ao afastamento da gnose. Tarefa árdua quando a minha vontade teima em se ancorar aos pequenos pedaços de coisa nenhuma que a sociedade me atira, como uma esmola a um mendigo. Desprezo quando assim é. Enoja-me a pequenez com que me tentam iludir.
Fiz um caminho até aqui, duro. Marcou-me com calos e cicatrizes no corpo e na alma. Houve amor mas esqueci-o rapidamente entre as muitas vielas onde as tentações se prostituem. Essas histórias estão escritas por aí, escondidas entre os textos que me fazem. Não lhes dou importância em demasia. Somente um acréscimo que pouco ocupa na memória.
Destacam-se os momentos em que segui sozinho, perdido, sem qualquer tipo de orientação. Mesmo implorando aos céus na esperança que algum deus clemente me escutasse. Nunca obtive êxito nas minhas preces. Nesses desgostos amargos e consecutivos, cheguei à conclusão que não devia procurar nos outros aquilo que devia encontrar em mim.
Fecundei a minha imaginação, as minhas forças, os meus impulsos e a minha sabedoria, numa orgia anárquica escrita com o sangue da fantasia. Todas as minhas arestas me pariram em simultâneo. Surgi eu, o observador! Nasci-me para me tornar a minha própria Divindade, sem templos, sem adoradores, sem milagres, nem tão pouco glória. Não me dei credo nem dogmas.
Talvez me conheças nestas linhas que se vão escrevendo entre a fúria e a tranquilidade. Mas não me mostro muito. Vou cumprindo uma espécie de missão de guia, para esse outro eu que anda desencontrado aqui neste mundo de gente sem rumo. Somos como uma simbiose entre o oculto e a aparência. Não vou dar mais explicações para aquilo que não se quer explicado. O mistério deseja a sua parte de mim e eu devotado a conhecer as suas entranhas.
Contudo isso são outras façanhas de um meu eu desconhecido até de mim mesmo. Viro também a minha atenção para vocês. Os corpos habitados por alma que comigo se cruzam. Tendes também os vossos segredos e inutilidades que me vão cativando. Mas isso fica para depois, quando não tiver muito a dizer sobre as minhas próprias considerações...
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