quarta-feira, dezembro 19, 2018

Como gente de carne e osso


Anoitece e o frio chega. Estou sozinho, enquanto a iluminação da rua se humilha na comparação com o sol que se esconde. Ainda assim, conforta-me alguma luz vazia.
Vem também humidade. Incómoda, que me morde a pele e pica a alma. Entranha-se adormecida no meu ânimo. Mesmo assim desperta-me. Estou acordado entre o pensar e o ser.
Hoje conheço-me. Escrevo-me com força implacável, em gentileza de guerreiro, violência de poeta, telepatia de amante. Filho do desejo. Poucas vezes me entendo assim, como gente de carne e osso, sem nada mais que me roube a atenção do mundo que me cerca.
Há os sons, as cores e os sentidos atentos a todos os estímulos. Encontro em mim vontade de acontecer. Tenho certezas banhadas com energia impulsiva. Sonhos nascidos da origem do impossível. Uma explosão de criatividade prestes a ganhar vida.
Ouvem-se vozes, tão banais quanto interessantes. Mostram-se rostos, cheios de histórias escondidas. Faz-me falta o toque noutro igual. Afinal de contas também sou um deles a baloiçar entre dramas e conquistas. Tenho vontades, ideias e esboços. Caí na derrota, elevei-me na vitória. Nada de especial se comparado aos demais, também eles entre o auge e o nulo.
Nos traços do meu semblante transcrevo tudo isto, como fazem os outros, mesmo sem o saberem. Deixo que o meu olhar fale uma língua calada, tal como falam os que amam (ou odeiam). Mesmo assim sei-me único, sem ostentar demais a minha singularidade. Não vá surgir quem me copie, ou pior, que seja eu a copiar alguém, ainda que de forma inconsciente. Simplesmente tomo consciência da minha pequena grandiosidade numa dança de pensamento e movimento. Tal como tu, entre todas as diferenças.

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