A estrada é longa, sem fim à vista. Não me importo, é melhor assim. Sabe bem percorrer um caminho extenso cheio de aventuras, cenários memoráveis, com pessoas que me preencham de histórias e sabedoria. Engrandece-se o eremita que sou, canta o viajante que me fiz, solto a audácia que me impele a seguir em frente a lugares onde o viver é intenso.
Acelero a fundo pelo asfalto livre. O motor responde com potência. Os tempos, as existências e a fantasia misturaram-se. Debaixo do aspecto clássico do automóvel está uma máquina impulsionada por um combustível desconhecido. Pouco me importa que seja movido a energia nuclear ou a éter mágico, não sou mecânico. Tudo que quero é ir onde a poesia me chamar.
Não me dei a mim mesmo um nome, talvez receba esse mérito quanto encontrar um destino, seja ele um tempo, um nascer, ou um poema. Tento recordar o início da viagem, quem sabe num sonho qualquer, ou num incentivo de um jovem curioso. Sobra-me a memória de entrar naquele carro construído com passado e futuro debaixo de olhares indiscretos.
Ainda é cedo para saber quem sou, portanto não me importo com isso. Afundo ainda mais o pé e uma nova paisagem abre-se como uma janela. Dou por mim a cruzar o infinito entre estrelas que surgem e fogem em breves ápices para quem as observa. Desacelero para contemplar este jardim feito de brilho onde desabrocha o mistério da criação.
A beleza é importante, assim como o calor de quem ama. Uma nova janela abre e entro naquilo que posso descrever apenas como o sentir do primeiro amor. O aconchego da inocência na pele perfeita da juventude. Imaginar um futuro sem saber que a dor existe. A ingenuidade de ser criança faz com que os devaneios tenham mais sabor.
Ficou claro que não pertencia ali, embora tenha agradecido o momento. Segui para outras paragens. Alternavam-se as noites e os dias, a cor e o frio, a paz e o ódio. Atravessava mundos escondidos no sentir da vivência humana. Experimentei várias sensações pela perspetiva de incontáveis juízos. Enveredei por trilhos ligados pelo entender de quem procura a imensidão.
Reencontrei-me com nome, corpo e história, como quem desperta de sonhar acordado pela atenção de um qualquer sentido humano. Dei por mim desperto (ou adormecido). À minha volta um panorama e rostos familiares, ainda assim desconhecidos. Já não havia um carro impossível, nem estrelas a dançar. A viagem terminou? Certamente que não!
Alguém chama o meu nome. Há! É esse! Lembrei-me de quem era afinal naquele existir. A aventura tinha sido real. Muito para além de mim. Mesmo sem explicação, ou cingida à minha fantasia. Não encontrei um destino. Nem sei se era sonho ou lembrança. Talvez fosse apenas um instante perdido, num segundo em que a imaginação me levou para longe com todo o seu saber.
6 comentários:
E se a viagem não for mais do que dias sem sabor que correm um atrás do outro? Gostava que a viagem fosse muito mais do que isso...
Janela, a viagem não é isso. Tu falas sobre estar parado, a viagem é exactamente o contrário ;)
Pergunto-me se o teu nome de viajante é o mesmo pelo qual te chamaram e reconheceste naquele momento. Ou se terás muitos e diversos nomes, consoante as viagens, as fantasias, os mundos que descobres na tua imaginação.
Não Antonio. Já fiz viagens dessas e nem sai de onde estava :)
Ana, os nomes (ou adjectivos) vão-se acumulando. Fundem-se, mudam de forma, evoluem, em constante mudança.
Janela, continuo a dizer, se fizeste viagens destas saíste, e muito, do lugar.
E assim respondes à minha curiosidade. ;)
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